Ciclo de Catequese – Jubileu 2025. Jesus Cristo Nossa Esperança. II. A vida de Jesus. As parábolas. 9. Bartimeu. “Tem coragem, levanta-te! Ele chama-te.” (Mc 10,49)
Com esta catequese, gostaria de orientar o nosso olhar para outro aspeto essencial da vida de Jesus: ou seja, as suas curas. Por isso, convido-vos a colocar diante do Coração de Cristo as vossas partes mais dolorosas ou frágeis, aqueles lugares da vossa vida onde vos sentis parados e bloqueados. Peçamos ao Senhor com confiança que ouça o nosso grito e nos cure!
O personagem que nos acompanha nesta reflexão ajuda-nos a compreender que nunca devemos abandonar a esperança, mesmo quando nos sentimos perdidos. Trata-se de Bartimeu, cego e mendigo, que Jesus encontrou em Jericó (cf. Mc 10, 40-52). O lugar é significativo: Jesus está a caminho de Jerusalém, mas inicia a sua viagem, por assim dizer, a partir do “submundo” de Jericó, uma cidade abaixo do nível do mar. Com efeito, com a sua morte, Jesus foi recuperar aquele Adão que caiu em baixo e que representa cada um de nós.
Bartimeu significa “filho de Timeu”: descreve aquele homem através de uma relação, mas está dramaticamente só. No entanto, este nome poderia significar também “filho da honra”, ou “da admiração”, exatamente o oposto da situação em que se encontra (é a interpretação dada também por Agostinho em O consenso dos evangelistas, 2, 65, 125: PL 34, 1138). E dado que o nome é tão importante na cultura judaica, significa que Bartimeu não consegue viver o que é chamado a ser.
Além disso, contrariamente ao grande movimento de pessoas que caminham atrás de Jesus, Bartimeu está parado. O evangelista diz que está sentado ao longo da estrada e, portanto, que precisa de alguém que o ponha de pé e o ajude a retomar o caminho.
O que podemos fazer quando nos encontramos numa situação que parece sem saída? Bartimeu ensina-nos a apelar aos recursos que temos em nós e que fazem parte de nós. Ele é um mendigo, sabe pedir, aliás consegue gritar! Se desejas realmente algo, fazes tudo para o poder alcançar, até quando os outros te censuram, te humilham e te dizem para desistir. Se o desejas realmente, continua a gritar!
O grito de Bartimeu, descrito no Evangelho de Marcos - «Filho de David, Jesus, tende piedade de mim!» (v. 47) - tornou-se uma oração bem conhecida na tradição oriental, que também nós podemos utilizar: «Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tende piedade de mim, pecador!».
Bartimeu é cego, mas paradoxalmente vê melhor do que os outros e reconhece quem é Jesus! Perante o seu grito, Jesus detém-se e chama-o (cf. v. 49), pois não há grito que Deus não ouça, até quando não estamos conscientes de nos dirigirmos a Ele (cf. Ex 2, 23). Parece estranho que, diante de um cego, Jesus não vá imediatamente ter com ele; contudo, se pensarmos bem, é o modo de reativar a vida de Bartimeu: impele-o a levantar-se, confia na sua possibilidade de caminhar. Aquele homem pode voltar a pôr-se de pé, pode ressurgir das suas situações de morte. Mas para o fazer deve realizar um gesto muito significativo: deve abandonar o seu manto (cf. v. 50)!
Para um mendigo, o manto é tudo: é a segurança, é a casa, é a defesa que o protege. Até a lei tutelava o manto do mendigo e impunha que fosse devolvido à noite, se tivesse sido penhorado (cf. Ex 22, 25). No entanto, muitas vezes o que nos bloqueia são precisamente as nossas aparentes seguranças, aquilo que vestimos para nos defendermos e que, pelo contrário, nos impede de caminhar. Para ir ao encontro de Jesus e para se deixar curar, Bartimeu deve expor-se a Ele em toda a sua vulnerabilidade. Esta é a passagem fundamental para qualquer caminho de cura.
Até a pergunta que Jesus lhe dirige parece estranha: «Que queres que eu te faça?» (v. 51). Mas, na realidade, não é óbvio que queiramos ser curados das nossas doenças, às vezes preferimos ficar parados para não assumir responsabilidades. A resposta de Bartimeu é profunda: utiliza o verbo anablepein, que pode significar “ver de novo”, mas que poderíamos traduzir também como “elevar o olhar”. Com efeito, Bartimeu não só quer voltar a ver, mas também quer recuperar a sua dignidade! Para elevar o olhar, é preciso levantar a cabeça. Às vezes, as pessoas estão bloqueadas porque a vida as humilhou e só desejam reencontrar o seu valor.
O que salva Bartimeu, e cada um de nós, é a fé. Jesus cura-nos para podermos ser livres. Ele não convida Bartimeu a segui-lo, mas diz-lhe que ande, que se ponha novamente a caminho (cf. v. 52). Mas Marcos conclui a narração, referindo que Bartimeu começou a seguir Jesus: escolheu livremente seguir aquele que é o Caminho!
Caros irmãos e irmãs, levemos com confiança a Jesus as nossas enfermidades e também as dos nossos entes queridos; levemos a dor de quantos se sentem perdidos e sem saída. Clamemos também por eles, certos de que o Senhor nos ouvirá e se deterá.
Papa Leão IX
Audiência Geral 11.06.2025
Ciclo de Catequese – Jubileu 2025. Jesus Cristo Nossa Esperança. II. A vida de Jesus. As parábolas 8. Os operários na vinha. «E disse-lhes: “Ide também vós para a vinha”» (Mt 20,4)
Desejo refletir novamente sobre uma parábola de Jesus. Também neste caso se trata de uma narração que alimenta a nossa esperança. Com efeito, às vezes temos a impressão de não conseguir encontrar um sentido para a nossa vida: sentimo-nos inúteis, inadequados, precisamente como os operários que aguardam na praça do mercado, à espera que alguém os leve para trabalhar. Mas por vezes o tempo passa, a vida corre, e não nos sentimos reconhecidos nem apreciados. Talvez não tenhamos chegado a tempo, talvez outros se tenham apresentado antes de nós, ou porventura as preocupações nos tenham detido noutro lugar.
A metáfora da praça do mercado é muito adequada até aos nossos tempos, pois o mercado é o lugar dos negócios, onde infelizmente as pessoas compram e vendem até o afeto e a dignidade, procurando obter algum lucro. E quando não se sentem valorizadas, reconhecidas, chegam a correr o risco de se vender ao primeiro licitante. Ao contrário, o Senhor recorda-nos que a nossa vida tem valor, e o seu desejo é ajudar-nos a descobri-lo.
Também na parábola que hoje comentamos, há operários que esperam que alguém os faça trabalhar por um dia. Estamos no capítulo 20 do Evangelho de Mateus e inclusive aqui encontramos uma figura que tem um comportamento insólito, que surpreende e questiona. É o dono de uma vinha que sai pessoalmente para ir em busca dos seus operários. Evidentemente, quer estabelecer uma relação pessoal com eles.
Como eu dizia, trata-se de uma parábola que infunde esperança, porque nos diz que este dono sai várias vezes à procura de quem espera dar um sentido à sua vida. O dono sai imediatamente de madrugada e depois, de três em três horas, volta a procurar trabalhadores para enviar à sua vinha. Seguindo este esquema, depois de sair às três horas da tarde, já não haveria razão para sair novamente, dado que o dia de trabalho terminava às seis horas.
Pelo contrário, este dono incansável, que quer valorizar a vida de cada um a todo o custo, sai também às cinco horas. Os trabalhadores que permaneceram na praça do mercado provavelmente tinham perdido toda a esperança. Aquele dia tinha sido em vão. E, no entanto, alguém ainda acreditou neles. Que sentido tem chamar operários só para a última hora do dia de trabalho? Que sentido tem ir trabalhar apenas uma hora? Contudo, até quando nos parece que podemos fazer pouco na vida, vale sempre a pena. Há sempre a possibilidade de encontrar um sentido, pois Deus ama a nossa vida!
Eis que a originalidade deste dono se vê também no fim do dia, na hora do pagamento. Com os primeiros trabalhadores, aqueles que vão para a vinha de madrugada, o dono tinha estabelecido um denário, que era o custo típico de um dia de trabalho. Para os outros, diz que lhes dará o que for justo. E é precisamente aqui que a parábola volta a provocar-nos: o que é justo? Para o dono da vinha, isto é, para Deus, é justo que cada um tenha o necessário para viver. Ele chamou pessoalmente os trabalhadores, conhece a sua dignidade e quer pagar-lhes com base nela. E dá a todos um denário.
A história diz que os trabalhadores da primeira hora ficam desiludidos: não conseguem ver a beleza do gesto do dono, que não foi injusto, mas simplesmente generoso, não considerou apenas o mérito, mas também a necessidade. Deus quer dar a todos o seu Reino, ou seja, a vida plena, eterna e feliz. E é o que Jesus faz em relação a nós: não faz classificações, dá tudo de Si mesmo a quantos lhe abrem o coração!
À luz desta parábola, o cristão de hoje poderia ser tentado a pensar: “Por que começar a trabalhar imediatamente? Se a remuneração é a mesma, por que trabalhar mais?”. Santo Agostinho respondia assim a estas dúvidas: «Por que razão, pois, demoras em seguir quem te chama, enquanto estás certo da remuneração, mas incerto quanto ao dia? Presta atenção a não tirares de ti, devido à tua hesitação, o que ele te oferecer em conformidade com a sua promessa» (Discurso 87, 6, 8).
Gostaria de dizer, especialmente aos jovens, que não esperem, mas que respondam com entusiasmo ao Senhor que nos chama a trabalhar na sua vinha. Não demoreis, arregaçai as mangas, pois o Senhor é generoso e não ficareis desiludidos! Trabalhando na sua vinha, encontrareis a resposta àquela pergunta profunda que trazeis dentro de vós: qual é o sentido da minha vida?
Caros irmãos e irmãs, não desanimemos! Até nos momentos obscuros da vida, quando o tempo passa sem nos dar as respostas que procuramos, peçamos ao Senhor que volte a sair e nos alcance onde estamos à sua espera. O Senhor é generoso e virá em breve!
Papa Leão IX
audiência geral 04.06.2025
Ciclo de Catequese – Jubileu 2025. Jesus Cristo Nossa Esperança. II. A vida de Jesus. As parábolas 7. O samaritano. Passou junto dele e, ao vê-lo, ficou profundamente compadecido. (Lc 10,33)
Continuemos a meditar sobre algumas parábolas do Evangelho que constituem uma ocasião para mudar de perspetiva e para nos abrirmos à esperança. Às vezes, a falta de esperança deve-se ao facto de nos fixarmos num certo modo rígido e fechado de ver as coisas, e as parábolas ajudam-nos a olhar para elas de outro ponto de vista.
Hoje gostaria de vos falar de uma pessoa experiente, preparada, um doutor da Lei que, contudo, deve mudar de perspetiva, porque está concentrado em si mesmo e não se dá conta dos outros (cf. Lc 10, 25-37). Com efeito, ele interroga Jesus sobre o modo como se “herda” a vida eterna, recorrendo a uma expressão que a entende como um direito inequívoco. Mas por detrás desta pergunta talvez se esconda precisamente uma necessidade de atenção: a única palavra sobre a qual pede explicações a Jesus é o termo “próximo”, que literalmente significa aquele que está perto.
Por isso, Jesus narra uma parábola que é um caminho para transformar aquela interrogação, para passar de quem me ama? a quem amou? A primeira é uma pergunta imatura, a segunda é a pergunta do adulto que compreendeu o sentido da sua vida. A primeira pergunta é a que pronunciamos quando nos colocamos num canto e esperamos, a segunda é a que nos impele a pôr-nos a caminho.
Com efeito, a parábola que Jesus narra tem como cenário uma estrada, e é uma estrada difícil e impérvia, como a vida. É a estrada percorrida por um homem que desce de Jerusalém, a cidade na montanha, para Jericó, a cidade abaixo do nível do mar. Trata-se de uma imagem que já prenuncia o que poderia acontecer: efetivamente, acontece que o homem é atacado, espancado, roubado e deixado meio-morto. É a experiência que ocorre quando as situações, as pessoas, às vezes até aqueles em quem confiamos, nos tiram tudo e nos deixam no meio do caminho.
No entanto, a vida é feita de encontros e, nestes encontros, revelamo-nos pelo que somos. Encontramo-nos diante do outro, perante a sua fragilidade e a sua fraqueza, e podemos decidir o que fazer: cuidar dele ou fingir que nada aconteceu. Um sacerdote e um levita descem por aquela mesma estrada. São pessoas que prestam serviço no Templo de Jerusalém, que habitam o espaço sagrado. Todavia, a prática do culto não leva automaticamente a ser compassivo. Com efeito, antes de ser uma questão religiosa, a compaixão é uma questão de humanidade! Antes de sermos crentes, somos chamados a ser humanos!
Podemos imaginar que, depois de terem permanecido muito tempo em Jerusalém, o sacerdote e o levita têm pressa de voltar para casa. É precisamente a pressa, tão presente na nossa vida, que muitas vezes nos impede de sentir compaixão. Quem pensa que o seu percurso deve ter a prioridade, não está disposto a parar por outra pessoa.
Mas eis que chega alguém que efetivamente é capaz de parar: trata-se de um samaritano, portanto de alguém que pertence a um povo desprezado (cf. 2 Rs 17). No seu caso, o texto não especifica a direção, mas diz apenas que se encontrava a caminho. Aqui, a religiosidade não tem nada a ver com isto. Este samaritano detém-se simplesmente porque é um homem diante de outro homem que precisa de ajuda.
A compaixão exprime-se através de gestos concretos. O evangelista Lucas concentra-se nas ações do samaritano, a quem chamamos “bom”, mas que no texto é simplesmente uma pessoa: o samaritano faz-se próximo, pois se quisermos ajudar alguém não podemos pensar em manter-nos à distância, devemos envolver-nos, sujar-nos, talvez contaminar-nos; faz curativos nas suas feridas depois de as ter limpado com azeite e vinho; carrega-o na sua cavalgadura, isto é, responsabiliza-se por ele, pois só ajudamos verdadeiramente se estivermos dispostos a sentir o peso da dor do outro; leva-o para uma hospedaria, onde gasta dinheiro, “dois denários”, mais ou menos dois dias de trabalho; e compromete-se a voltar e eventualmente a pagar mais, porque o outro não é um pacote a entregar, mas alguém de quem devemos cuidar.
Caros irmãos e irmãs, quando também nós seremos capazes de interromper o nosso caminho e ter compaixão? Quando compreendermos que o homem ferido ao longo da estrada representa cada um de nós. E então a recordação de todas as vezes que Jesus parou para cuidar de nós tornar-nos-á mais capazes de compaixão.
Portanto, oremos para poder crescer em humanidade, a fim de que as nossas relações sejam mais verdadeiras, mais ricas de compaixão. Peçamos ao Coração de Cristo a graça de ter cada vez mais os seus próprios sentimentos.
Papa Leão IX
audiência geral 28.05.2025
imagem: Jean Francois Millet
Ciclo de Catequese – Jubileu 2025. Jesus Cristo Nossa Esperança. II. A vida de Jesus. As parábolas 6. O semeador. Falou-lhes, então, de muitas coisas em parábolas (Mt 13,3)
Estou feliz por vos dar as boas-vindas a esta minha primeira Audiência geral. Hoje retomo o ciclo de catequeses jubilares, sobre o tema «Jesus Cristo, nossa esperança», iniciadas pelo Papa Francisco.
Hoje continuamos a meditar sobre as parábolas de Jesus, que nos ajudam a redescobrir a esperança, porque nos mostram como Deus age na história. Hoje gostaria de meditar sobre uma parábola um pouco especial, pois é uma espécie de introdução a todas as parábolas. Refiro-me à do semeador (cf. Mt 13, 1-17). Em certo sentido, nesta história podemos reconhecer o modo de comunicar de Jesus, que tem muito a ensinar-nos para o anúncio do Evangelho hoje.
Cada parábola narra uma história tirada da vida de todos os dias, mas quer dizer-nos algo mais, remetendo-nos para um significado mais profundo. A parábola desperta em nós interrogações, convida-nos a não nos limitarmos às aparências. Perante a história que me é contada ou a imagem que me é dada, posso interrogar-me: onde estou nesta história? O que diz esta imagem à minha vida? Aliás, o termo parábola vem do verbo grego paraballein, que significa lançar para a frente. A parábola projeta diante de mim uma palavra que me desperta, levando-me a questionar-me.
A parábola do semeador fala exatamente da dinâmica da palavra de Deus e dos efeitos que ela produz. Com efeito, cada palavra do Evangelho é como uma semente lançada no terreno da nossa vida. Jesus usa muitas vezes a imagem da semente, com diferentes significados. No capítulo 13 do Evangelho de Mateus, a parábola do semeador introduz uma série de outras pequenas parábolas, algumas das quais falam precisamente do que acontece na terra: o trigo e o joio, o grãozinho de mostarda, o tesouro escondido no campo. No que consiste, então, este solo? É o nosso coração, mas é também o mundo, a comunidade, a Igreja. Com efeito, a palavra de Deus fecunda e suscita cada realidade.
No início, vemos Jesus que sai de casa e à sua volta reúne-se uma grande multidão (cf. Mt 13, 1). A sua palavra fascina e intriga. Entre as pessoas, há obviamente muitas situações diferentes. A palavra de Jesus é para todos, mas age em cada um de modo diverso. Este contexto permite-nos compreender melhor o sentido da parábola.
Um semeador muito original sai para semear, mas não se preocupa com o lugar onde a semente cai. Lança a semente até onde é improvável que dê fruto: ao longo da estrada, entre as pedras, no meio dos arbustos. Esta atitude surpreende o ouvinte, levando-o a questionar-se: como é possível?
Estamos habituados a calcular as coisas - e às vezes é necessário - mas isto não vale no amor! O modo como este semeador “esbanjador” lança a semente é uma imagem da maneira como Deus nos ama. Aliás, é verdade que o destino da semente depende também do modo como o terreno a acolhe e da situação em que se encontra, mas nesta parábola Jesus diz-nos sobretudo que Deus lança a semente da sua palavra em todos os tipos de solo, isto é, em qualquer uma das nossas situações: às vezes somos mais superficiais e distraídos, outras vezes deixamo-nos levar pelo entusiasmo, por vezes sentimo-nos oprimidos pelas preocupações da vida, mas há também momentos em que estamos disponíveis e somos acolhedores. Deus confia e espera que, mais cedo ou mais tarde, a semente floresça. É assim que nos ama: não espera que nos tornemos o melhor terreno, concede-nos sempre generosamente a sua palavra. Talvez precisamente vendo que Ele confia em nós, nasça em nós o desejo de ser uma terra melhor. Esta é a esperança, fundada na rocha da generosidade e da misericórdia de Deus.
Narrando o modo como a semente dá fruto, Jesus fala também da sua vida. Jesus é a Palavra, a Semente. E para dar fruto, a semente deve morrer. Então, esta parábola diz-nos que Deus está pronto a “desperdiçar” por nós e que Jesus está disposto a morrer para transformar a nossa vida.
Tenho em mente aquela maravilhosa pintura de van Gogh: O semeador ao pôr do sol. Aquela imagem do semeador sob o sol ardente fala-me também do trabalho do camponês. E surpreende-me que, por detrás do semeador, van Gogh tenha representado o grão já maduro. Parece-me exatamente uma imagem de esperança: de uma maneira ou de outra, a semente deu fruto. Não sabemos bem como, mas é assim! Contudo no centro da cena não está o semeador, que se encontra de lado, mas toda a pintura é dominada pela imagem do sol, talvez para nos recordar que é Deus quem move a história, embora às vezes pareça ausente ou distante. É o sol que aquece os torrões da terra, fazendo amadurecer a semente.
Caros irmãos e irmãs, em que situação da vida de hoje a palavra de Deus nos alcança? Peçamos ao Senhor a graça de acolher sempre esta semente, que é a sua palavra. E se nos dermos conta de que não somos um terreno fecundo, não desanimemos, mas peçamos-lhe que nos trabalhe ainda mais para fazer de nós uma terra melhor.
Papa Leão IX
Audiência Geral 21.05.2025
imagem: semeador Van Gohh
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 9. "Eu acredito no Espírito Santo". O Espírito Santo na fé da Igreja
Com a catequese de hoje, passamos daquilo que nos foi revelado sobre o Espírito Santo na Sagrada Escritura, para o modo como Ele está presente e age na vida da Igreja, na nossa vida cristã.
Nos primeiros três séculos, a Igreja não sentiu a necessidade de formular explicitamente a sua fé no Espírito Santo. Por exemplo, no mais antigo Credo da Igreja, o chamado Símbolo apostólico, depois de proclamar: “Creio em Deus Pai, criador do céu e da terra, e em Jesus Cristo, que nasceu, morreu, desceu aos infernos, ressuscitou e subiu aos céus”, acrescenta-se: “[Creio] no Espírito Santo”, nada mais, sem especificação alguma.
Mas foi a heresia que impeliu a Igreja a definir esta sua fé. Quando este processo teve início - com Santo Atanásio, no século IV - foi precisamente a sua experiência da ação santificadora e divinizadora do Espírito Santo que levou a Igreja à certeza da plena divindade do Espírito Santo. Isto aconteceu no Concílio Ecuménico de Constantinopla, em 381, que definiu a divindade do Espírito Santo com as conhecidas palavras que ainda hoje repetimos no Credo: «Creio no Espírito Santo, que é Senhor e dá a vida, e procede do Pai e do Filho. Com o Pai e o Filho é adorado e glorificado, e falou por meio dos profetas».
Dizer que o Espírito Santo “é Senhor” era como afirmar que Ele compartilha o “Senhorio” de Deus, que pertence ao mundo do Criador, não ao das criaturas. A afirmação mais vigorosa é que a Ele são devidas as mesmas glória e adoração que ao Pai e ao Filho. É o argumento da igualdade na honra, caro a São Basílio Magno, que foi o principal artífice desta fórmula: o Espírito Santo é Senhor, é Deus!
A definição conciliar não era um ponto de chegada, mas de partida. E, com efeito, uma vez superados os motivos históricos que tinham impedido uma afirmação mais explícita da divindade do Espírito Santo, ela foi tranquilamente proclamada no culto da Igreja e na sua teologia. Já São Gregório de Nazianzo, após aquele Concílio, afirmará sem ulterior hesitação: «O Espírito Santo é, então, Deus? Certamente! É consubstancial? Sim, se é verdadeiro Deus» (Oratio 31, 5.10).
O que nos diz, a nós crentes de hoje, o artigo de fé que proclamamos todos os domingos na Missa: “Creio no Espírito Santo”? Dele, no passado, falava-se principalmente a propósito da afirmação de que o Espírito Santo “procede do Pai”. A Igreja latina completou depressa esta afirmação, acrescentando, no Credo da Missa, que o Espírito Santo procede “também do Filho”. Dado que em latim a expressão “e do Filho” se chama “Filioque”, daqui surgiu a disputa conhecida com este nome, que foi a razão (ou o pretexto) de muitas contendas e divisões entre a Igreja do Oriente e a Igreja do Ocidente. Certamente não é o caso de abordar aqui esta questão que, de resto, no clima de diálogo que se estabeleceu entre as duas Igrejas, perdeu a dureza do passado e hoje permite esperar numa plena aceitação recíproca, como uma das principais “diferenças reconciliadas”. Gosto de dizer isto: “diferenças reconciliadas”. Entre os cristãos, existem muitas diferenças: este é desta escola, da outra; este é protestante, aquele... O importante é que estas diferenças sejam reconciliadas, no amor de caminhar juntos.
Superado este obstáculo, hoje podemos valorizar a prerrogativa mais importante para nós, proclamada no artigo do Credo, ou seja, que o Espírito Santo é “vivificante”, isto é, dá a vida. Perguntemo-nos: que vida dá o Espírito Santo? No início, na criação, o sopro de Deus dá a Adão a vida natural; de uma estátua de barro, faz dele “um ser vivo” (cf. Gn 2, 7). Agora, na nova criação, é o Espírito Santo que dá aos crentes uma vida nova, a vida de Cristo, a vida sobrenatural de filhos de Deus. Paulo pode exclamar: «A lei do Espírito, que dá vida em Cristo Jesus, libertou-vos da lei do pecado e da morte» (Rm 8, 2).
Onde está, em tudo isto, a grande e consoladora notícia para nós? É que a vida que nos é dada pelo Espírito Santo é vida eterna! A fé liberta-nos do horror de ter que admitir que tudo acaba aqui, que não há resgate algum para o sofrimento e a injustiça que reinam soberanas na terra. É o que nos garante outra palavra do Apóstolo: «Se o Espírito de Deus, que ressuscitou Jesus de entre os mortos, habita em vós, aquele que ressuscitou Cristo de entre os mortos também dará vida aos vossos corpos mortais pelo seu Espírito, que habita em vós» (Rm 8, 11). O Espírito habita em nós, está dentro de nós.
Cultivemos esta fé também por aqueles que, muitas vezes sem culpa própria, estão desprovidos dela e não conseguem dar um sentido à vida. E não nos esqueçamos de dar graças Àquele que, com a sua morte, nos alcançou esta dádiva inestimável!
Papa Francisco
Audiência Geral
16.10.24
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 8. “Todos ficaram cheios do Espírito Santo”. O Espírito Santo nos Atos dos Apóstolos
No nosso itinerário de catequeses sobre o Espírito Santo e a Igreja, hoje referimo-nos ao Livro dos Atos dos Apóstolos.
A narração da descida do Espírito Santo no Pentecostes começa com a descrição de alguns sinais preparatórios - o vento impetuoso e as línguas de fogo - mas conclui-se com a afirmação: «E todos ficaram cheios do Espírito Santo» (At 2, 4). São Lucas - que escreveu os Atos dos Apóstolos – realça que o Espírito Santo é Aquele que assegura a universalidade e a unidade da Igreja. O efeito imediato de ficar “cheios do Espírito Santo” é que os Apóstolos «começaram a falar noutras línguas» e saíram do Cenáculo para anunciar Jesus Cristo à multidão (cf. At 2, 4 ss.).
Agindo assim, Lucas quis frisar a missão universal da Igreja, como sinal de uma nova unidade entre todos os povos. Vemos de duas maneiras que o Espírito trabalha pela unidade. Por um lado, impele a Igreja para fora, a fim de que possa acolher cada vez mais pessoas e povos; por outro, reúne-a no seu interior para consolidar a unidade alcançada. Ensina-a a dilatar-se na universalidade e a reunir-se na unidade. Universal e una: este é o mistério da Igreja.
O primeiro dos dois movimentos - a universalidade - vemo-lo em ação no capítulo 10 dos Atos, no episódio da conversão de Cornélio. No dia de Pentecostes, os Apóstolos tinham anunciado Cristo a todos os judeus e observantes da lei mosaica, independentemente do povo a que pertencessem. É preciso outro “pentecostes”, muito semelhante ao primeiro, o da casa do centurião Cornélio, para induzir os Apóstolos a dilatar o horizonte e derrubar a última barreira, aquela que separa judeus e pagãos (cf. At 10-11).
A esta expansão étnica acrescenta-se a geográfica. Paulo – lê-se ainda nos Atos dos Apóstolos (cf. 16, 6-10) - queria anunciar o Evangelho numa nova região da Ásia Menor; mas, está escrito, «o Espírito Santo impediu-o»; queria ir à Bitínia «mas o Espírito de Jesus não o permitiu». Descobre-se imediatamente a razão destas surpreendentes proibições do Espírito: na noite seguinte, em sonho, o Apóstolo recebeu a ordem de passar à Macedónia. Assim, o Evangelho saiu da Ásia natal e entrou na Europa.
O segundo movimento do Espírito Santo - aquele que cria a unidade - vemo-lo em ação no capítulo 15 dos Atos, durante a realização do chamado Concílio de Jerusalém. O problema é como fazer com que a universalidade alcançada não comprometa a unidade da Igreja. O Espírito Santo nem sempre realiza a unidade de maneira repentina, com intervenções milagrosas e decisivas, como no Pentecostes. Fá-lo também - e na maior parte dos casos - com um trabalho discreto, respeitador dos tempos e das divergências humanas, passando por pessoas e instituições, oração e confronto. De uma forma, diríamos hoje, sinodal. Foi o que aconteceu, efetivamente, no Concílio de Jerusalém, sobre a questão das obrigações da Lei mosaica a impor aos convertidos do paganismo. A sua solução foi anunciada a toda a Igreja, com as conhecidas palavras: «Decidimos, o Espírito Santo e nós...» (At 15, 28).
Santo Agostinho explica a unidade realizada pelo Espírito Santo com uma imagem que se tornou clássica: «O que a alma é para o corpo humano, o Espírito Santo é para o corpo de Cristo, que é a Igreja» (Discursos, 267, 4). Esta imagem ajuda-nos a compreender algo importante. O Espírito Santo não realiza a unidade da Igreja a partir de fora; não se limita a mandar que se unam. Ele mesmo é o “vínculo de unidade”. É Ele quem faz a unidade da Igreja.
Como sempre, concluímos com um pensamento que nos ajuda a passar do conjunto da Igreja para cada um de nós. A unidade da Igreja é a unidade entre pessoas e não se realiza de modo abstrato, mas na vida. Realiza-se na vida! Todos nós queremos a unidade, todos a desejamos do mais íntimo do coração; no entanto, ela é tão difícil de alcançar que, até no seio do matrimónio e da família, a união e a concórdia estão entre as coisas mais difíceis de conseguir, e ainda mais difíceis de manter.
O motivo - pelo qual a unidade entre nós é difícil - é que cada um quer, sim, que a unidade seja alcançada, mas em volta do próprio ponto de vista, sem pensar que o outro que está à sua frente pensa exatamente o mesmo sobre o “seu” ponto de vista. Por este caminho, a unidade só se afasta. A unidade de vida, a unidade do Pentecostes, segundo o Espírito, só se alcança quando nos esforçamos por colocar Deus, e não a nós próprios, no centro. Também a unidade dos cristãos se constrói assim: não esperando que os outros venham ao nosso encontro, onde estamos, mas caminhando juntos rumo a Cristo.
Peçamos ao Espírito Santo que nos ajude a ser instrumentos de unidade e de paz.
Papa Francisco
Audiência Geral
09.10.24
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 7. Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto. O Espírito Santo é o nosso aliado na luta contra o espírito do mal
Imediatamente após o seu batismo no Jordão, Jesus «foi conduzido pelo Espírito para o deserto, a fim de ser tentado pelo diabo» (Mt 4, 1) - assim reza o Evangelho de Mateus. A iniciativa não é de satanás, mas de Deus. Indo para o deserto, Jesus obedece a uma inspiração do Espírito Santo, não cai numa armadilha do inimigo, não! Uma vez superada a provação, Ele - está escrito – voltou para a Galileia «com o poder do Espírito Santo» (Lc 4, 14).
No deserto, Jesus livrou-se de satanás e agora pode libertar de satanás. É isto que os Evangelistas realçam com as numerosas histórias de libertação de endemoninhados. Jesus diz aos seus opositores: «Se é em virtude do Espírito de Deus que expulso demónios, então o Reino de Deus chegou entre vós» (Mt 12, 27).
Hoje assistimos a um estranho fenómeno relativo ao diabo. A um certo nível cultural, considera-se que ele simplesmente não existe. Seria um símbolo do inconsciente coletivo, ou da alienação, em síntese, uma metáfora. Mas «a maior astúcia do demónio é levar a crer que ele não existe», como alguém escreveu (Charles Baudelaire). É astuto: faz-nos crer que não existe e assim domina tudo. É ardiloso! E, no entanto, o nosso mundo tecnológico e secularizado está repleto de magos, ocultismo, espiritismo, astrólogos, vendedores de feitiços e amuletos e, infelizmente, de verdadeiras seitas satânicas. Expulso pela porta, o diabo voltou a entrar, dir-se-ia, pela janela. Expulso pela fé, volta a entrar com a superstição. E se fores supersticioso, inconscientemente dialogas com o diabo. Com o diabo não se conversa!
A provação mais forte da existência de satanás não está nos pecadores, nem nos endemoninhados, mas nos santos! “E porquê, Padre?”. Sim, é verdade que o diabo está presente e age mediante certas formas extremas e “desumanas” de maldade e perversidade que vemos à nossa volta. Mas por este caminho, nos casos individuais, é praticamente impossível chegar à certeza de que se trata precisamente dele, dado que não podemos saber exatamente onde termina a sua ação e onde começa a nossa própria maldade. Por isso, a Igreja é muito prudente e rigorosa no exercício do exorcismo, ao contrário do que se verifica, infelizmente, em certos filmes!
É na vida dos santos, precisamente ali, que o diabo é obrigado a manifestar-se, a pôr-se “contra a luz”. Uns mais, outros menos, todos os santos, todos os grandes crentes, dão testemunho da sua luta contra esta realidade obscura, e não se pode honestamente supor que todos eram iludidos ou simples vítimas dos preconceitos do seu tempo.
A batalha contra o espírito maligno vence-se como Jesus a venceu no deserto: com a força da palavra de Deus. Vede que Jesus não conversa com o diabo, nunca dialoga com o demónio. Ou o expulsa, ou o condena, mas nunca dialoga. E, no deserto, não responde com a sua palavra, mas com a palavra de Deus. Irmãos e irmãs, nunca dialogueis com o diabo! Quando ele vem com tentações: “mas isto seria bom, aquilo seria bom”, detém-te! Eleva o teu coração ao Senhor, reza a Nossa Senhora e expulsa-o, como Jesus nos ensinou a expulsá-lo. São Pedro sugere também outro meio, de que Jesus não necessitava, mas nós sim, a vigilância: «Sede sóbrios, vigiai. O vosso inimigo, o diabo, anda às voltas como leão que ruge, procurando a quem devorar» (1 Pd 5, 8). E São Paulo diz-nos: «Não deis ocasião ao diabo» (Ef 4, 27).
Depois que Cristo, na cruz, derrotou para sempre o poder do «príncipe deste mundo» ( Jo 12, 31), o diabo - dizia um Padre da Igreja - «está preso, como um cão acorrentado; não pode morder ninguém, a não ser aqueles que, desafiando o perigo, se aproximam dele... Pode ladrar, pode insistir, mas não pode morder, exceto quem o quiser». [1] Se fores tolo e disseres ao diabo: “Ah, como estás?”, ele arruinar-te-á. O diabo? À distância! Com o diabo não se dialoga. Devemos afugentá-lo. Distância. E todos nós, todos, temos a experiência de como o diabo se aproxima com alguma tentação, sobre os dez mandamentos. Quando sentirmos isto, paremos, distância! Não nos aproximemos do cão acorrentado!
A tecnologia moderna, por exemplo, além de muitos recursos positivos que devem ser apreciados, oferece também inúmeros meios para “dar ocasião ao diabo”, e muitos caem nela. Pensemos na pornografia na internet, por detrás da qual existe um mercado deveras florescente, todos o sabemos. É o diabo que trabalha ali. Trata-se de um fenómeno muito difundido, que, no entanto, os cristãos devem ter em conta e rejeitar vigorosamente. Pois qualquer telemóvel tem acesso a esta brutalidade, a esta linguagem do diabo: a pornografia na internet.
A consciência da ação do diabo na história não deve desencorajar-nos. O pensamento final deve ser, até neste caso, de confiança e segurança: “Estou com o Senhor, vai-te embora!”. Cristo venceu o demónio e concedeu-nos o Espírito Santo para fazer nossa a sua vitória. A própria ação do inimigo pode tornar-se vantajosa para nós se, com a ajuda de Deus, a pusermos ao serviço da nossa purificação. Peçamos, pois, ao Espírito Santo, com as palavras do hino Veni Creator:
“Afasta de nós o inimigo
e concede-nos depressa a paz.
Contigo que nos guias
evitaremos todo o mal!”.
Prestai atenção, pois o diabo é astuto. Mas nós, cristãos, com a graça de Deus, somos mais espertos do que ele. Obrigado!
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[1] São Cesário de Arles, Discursos 121, 6: CC 103, p. 507.
Papa Francisco
Audiência Geral
25.09.24
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 6. “O Espírito do Senhor está sobre mim.” O Espírito Santo no Batismo de Jesus
Hoje reflitamos sobre o Espírito Santo que desce sobre Jesus no batismo do Jordão e, d’Ele, se difunde no seu corpo, que é a Igreja. No Evangelho de Marcos, a cena do batismo de Jesus é assim descrita: «Naqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia e foi batizado no Jordão por João. E assim que saiu da água, viu os céus abertos e o Espírito que desceu sobre Ele como uma pomba. E do céu ouviu-se uma voz: “Tu és o meu Filho muito amado: em ti pus toda a minha complacência”» (Mc 1, 9-11).
Toda a Trindade marcou encontro, naquele momento, nas margens do Jordão! É o Pai que se faz presente com a sua voz; é o Espírito Santo que desce sobre Jesus sob forma de pomba; e é aquele que o Pai proclama como seu Filho amado, Jesus. É um momento muito importante da Revelação, é um momento importante da história da salvação. Far-nos-á bem reler esta passagem do Evangelho.
O que aconteceu de tão importante no batismo de Jesus, para induzir todos os evangelistas a narrá-lo? Encontramos a resposta nas palavras que Jesus pronuncia, pouco tempo depois, na sinagoga de Nazaré, com clara referência ao acontecimento do Jordão: «O Espírito do Senhor está sobre mim; foi por isto que me consagrou com a unção» (Lc 4, 18).
No Jordão, Deus Pai “ungiu com o Espírito Santo”, ou seja, consagrou Jesus como Rei, Profeta e Sacerdote. Com efeito, no Antigo Testamento, os reis, os profetas e os sacerdotes eram ungidos com óleo perfumado. No caso de Cristo, em vez do óleo físico, há o óleo espiritual que é o Espírito Santo; em vez do símbolo, há a realidade: é o próprio Espírito que desce sobre Jesus.
Jesus está cheio do Espírito Santo desde o primeiro instante da sua Encarnação. Mas esta era uma “graça pessoal”, incomunicável; agora, pelo contrário, com esta unção, recebe a plenitude do dom do Espírito, mas para a sua missão que, como cabeça, comunicará ao seu corpo, que é a Igreja, e a cada um de nós. Por isso, a Igreja é o novo “povo real, povo profético, povo sacerdotal”. O termo hebraico “Messias” e o vocábulo correspondente em grego “Cristo” - Christós - ambos referidos a Jesus, significam “ungido”: foi ungido com o óleo da alegria, ungido com o Espírito Santo. O nosso próprio nome “cristãos” será explicado pelos Padres em sentido literal: cristãos significa “ungidos à imitação de Cristo”.1
Na Bíblia um Salmo fala de um óleo perfumado derramado sobre a cabeça do sumo sacerdote Aarão e que desce até à orla da sua veste (cf. Sl 133, 2). Esta imagem poética do óleo que desce, usada para descrever a felicidade de viver juntos como irmãos, tornou-se realidade espiritual e realidade mística em Cristo e na Igreja. Cristo é a cabeça, o nosso Sumo Sacerdote; o Espírito Santo é o óleo perfumado e a Igreja é o corpo de Cristo no qual se difunde.
Vimos porque, na Bíblia, o Espírito Santo é simbolizado pelo vento e, aliás, recebe dele o próprio nome, Ruah - vento. Vale a pena perguntar-nos também porque é simbolizado pelo óleo e que ensinamento prático podemos obter deste símbolo. Na Missa de Quinta-Feira Santa, consagrando o óleo chamado “Crisma”, o bispo, referindo-se a quantos receberão a unção no Batismo e na Confirmação, diz: «Que esta unção os penetre e santifique, para que, libertados da corrupção nativa e consagrados como templo da sua glória, propaguem o perfume de uma vida santa». É uma aplicação que remonta a São Paulo, que aos Coríntios escreve: «Sim, diante de Deus nós somos o perfume de Cristo» (2 Cor 2, 15). A unção faz de nós perfume, e também uma pessoa que vive com alegria a sua unção perfuma a Igreja, perfuma a comunidade, perfuma a família com este aroma espiritual.
Sabemos que, infelizmente, às vezes os cristãos não difundem o perfume de Cristo, mas o mau cheiro do próprio pecado. E nunca nos esqueçamos: o pecado afasta-nos de Jesus, o pecado transforma-nos em óleo mau. E o diabo - não vos esqueçais disto - normalmente, o diabo entra pelos bolsos - tende cuidado! E isto, no entanto, não nos deve desviar do compromisso de realizar, na medida do possível e cada um no seu ambiente, esta sublime vocação de ser o bom perfume de Cristo no mundo. O perfume de Cristo emana dos “frutos do Espírito”, que são «amor, alegria, paz, magnanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio de si» (Gl 5, 22). Paulo disse-o, e como é bom encontrar uma pessoa com estas virtudes: uma pessoa com amor, uma pessoa alegre, uma pessoa que cria a paz, uma pessoa magnânima, não mesquinha, uma pessoa benevolente que acolhe todos, uma pessoa bondosa. É bom encontrar uma pessoa boa, uma pessoa fiel, uma pessoa mansa, não orgulhosa... Se nos esforçarmos por cultivar estes frutos e quando encontrarmos estas pessoas, então, sem nos darmos conta, alguém sentirá ao nosso redor um pouco da fragrância do Espírito de Cristo. Peçamos ao Espírito Santo que nos torne mais conscientes, ungidos, ungidos por Ele.
Papa Francisco
Audiência Geral 21.08.2024
1 Cf. São Cirilo de Jerusalém, Catequese mistagógica, III,1.
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 5. “Encarnado por obra do Espírito Santo pela virgem Maria”. Como conceber e dar à luz Jesus
Com a catequese de hoje entramos na segunda fase da história da salvação. Depois de ter contemplado o Espírito Santo na obra da Criação, contemplá-lo-emos durante algumas semanas na obra da Redenção, isto é, de Jesus Cristo. Passemos, então, ao Novo Testamento e vejamos o Espírito Santo no Novo Testamento.
O tema de hoje é o Espírito Santo na Encarnação do Verbo. No Evangelho de Lucas, lemos: «O Espírito Santo descerá sobre ti» - ou Maria - «o poder do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra» (1, 35). O evangelista Mateus confirma este dado fundamental sobre Maria e o Espírito Santo, dizendo que Maria «ficou grávida por obra do Espírito Santo» (1, 18).
A Igreja acolheu este facto revelado e colocou-o muito cedo no coração do seu Símbolo de fé. No Concílio Ecuménico de Constantinopla de 381 - o mesmo que definiu a divindade do Espírito Santo - este artigo entrou na fórmula do “Credo”.
Portanto, trata-se de um dado de fé ecuménico, pois todos os cristãos professam juntos esse mesmo Símbolo da fé. A piedade católica, desde tempos imemoráveis, extrai dele uma das suas orações quotidianas, o Angelus.
Este artigo de fé é o fundamento que permite falar de Maria como a Esposa por excelência, que é figura da Igreja. Com efeito, Jesus - escreve São Leão Magno - «dado que Ele nasceu por obra do Espírito Santo de uma mãe virgem, assim torna a Igreja, sua Esposa imaculada, fecunda com o sopro vital do mesmo Espírito» [1]. Este paralelismo é retomado na Constituição Dogmática Lumen gentium, que diz: «Pela sua fé e obediência, Maria gerou na terra o mesmo Filho de Deus, sem contacto com homem, mas envolta pelo Espírito Santo. [...] Agora, contemplando a santidade milagrosa da Virgem, imitando a sua caridade e cumprindo fielmente a vontade do Pai através da Palavra fielmente recebida, a Igreja torna-se também mãe, pois, pela pregação e pelo batismo, gera os seus filhos, concebidos pelo Espírito Santo e nascidos de Deus, para uma vida nova e imortal» (nn. 63, 64).
Concluímos com uma reflexão prática para a nossa vida, sugerida pela insistência da Escritura nos verbos “conceber” e “dar à luz”. Na profecia de Isaías, ouvimos: «Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho» (7, 14); e o Anjo diz a Maria: «Conceberás e darás à luz um filho» (Lc 1, 31). Maria primeiro concebeu, depois deu à luz Jesus: primeiro recebeu-o em si, no seu coração e na sua carne, depois deu-o à luz.
É o que acontece com a Igreja: primeiro acolhe a Palavra de Deus, deixa-a “falar ao seu coração” (cf. Os 2, 16) e “encher as suas entranhas” (cf. Ez 3, 3), segundo duas expressões bíblicas, e depois dá-a à luz com a vida e a pregação. Esta última é estéril sem a primeira.
Também a Igreja, face às tarefas que superam as suas forças, se coloca espontaneamente a mesma questão: “Como é possível isto?”. Como é possível anunciar Jesus Cristo e a sua salvação a um mundo que parece procurar apenas o bem-estar? A resposta é também a mesma de outrora: «Recebereis a força do Espírito Santo [...]». Sem o Espírito Santo, a Igreja não pode ir em frente, a Igreja não cresce, a Igreja não pode pregar.
O que se diz da Igreja em geral aplica-se também a nós, a cada batizado. Cada um de nós encontra-se por vezes, na vida, em situações maiores do que as próprias forças e pergunta-se: “Como posso enfrentar esta situação?”. Nesses casos, é útil repetir para si mesmo o que o anjo disse à Virgem: «A Deus nada é impossível» (Lc 1, 37).
Irmãos e irmãs, retomemos também nós o nosso caminho, cada vez com esta certeza reconfortante no coração: “Nada é impossível a Deus”. E se acreditarmos nisto, faremos milagres. Nada é impossível a Deus.
Papa Francisco
Audiência Geral 07.08.2024
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[1] Discurso 12º sobre a Paixão, 3, 6: PL 54, 356.
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 4. O Espírito ensina a Noiva a orar. Os Salmos, sinfonia de oração na Bíblia
Em preparação para o próximo Jubileu, convidei a dedicar o ano de 2024 «a uma grande “sinfonia” de oração». [1] Com a catequese de hoje, gostaria de recordar que a Igreja já possui uma sinfonia de oração, cujo compositor é o Espírito Santo, e é o Livro dos Salmos.
Como em cada sinfonia, nele há vários “movimentos”, ou seja, diferentes tipos de oração: louvor, ação de graças, súplica, lamentação, narração, reflexão sapiencial e outros, tanto na forma pessoal como na forma coral de todo o povo. São os cânticos que o próprio Espírito pôs nos lábios da Esposa, a Igreja. Como recordei da última vez, todos os Livros da Bíblia são inspirados pelo Espírito Santo, mas o Livro dos Salmos também o é, no sentido de que está cheio de veia poética.
Os salmos ocuparam um lugar privilegiado no Novo Testamento. Com efeito, houve e ainda há edições que contêm o Novo Testamento e os Salmos juntos. Na minha escrivaninha tenho uma edição em ucraniano do Novo Testamento e dos Salmos, de um soldado que morreu durante a guerra, que me foi enviada; ele rezava na frente com este livro. Nem todos os salmos - nem tudo de cada salmo - podem ser repetidos e feitos próprios pelos cristãos e ainda menos pelo homem moderno. Às vezes eles refletem uma situação histórica e uma mentalidade religiosa que já não são nossas. Isto não significa que não sejam inspirados mas que, sob certos aspetos, estão ligados a um período e a uma fase provisória da revelação, como acontece também com grande parte da legislação antiga.
O que mais nos recomenda a aceitação dos salmos é que eles constituíram a oração de Jesus, de Maria, dos Apóstolos e de todas as gerações cristãs que nos precederam. Quando os recitamos, Deus ouve-os com aquela grandiosa “orquestração”, que é a comunhão dos santos. Segundo a Carta aos Hebreus, Jesus entra no mundo com o versículo de um salmo no coração: «Eis que venho, ó Deus, para cumprir a tua vontade» (cf. Hb 10, 7; Sl 40, 9); e, segundo o Evangelho de Lucas, deixa o mundo com outro salmo nos lábios: «Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc 23, 46; cf. Sl 31, 6).
Ao uso dos salmos no Novo Testamento segue-se o dos Padres e de toda a Igreja, que fazem deles um elemento fixo na celebração da Missa e na Liturgia das horas. «Toda a Sagrada Escritura exala a bondade de Deus - diz Santo Ambrósio - mas de modo particular o doce Livro dos Salmos». [2] O doce livro dos salmos. Pergunto-me: recitais às vezes os salmos? Lede a Bíblia e recitai um salmo. Por exemplo, quando estais um pouco tristes por ter pecado, recitais o salmo 50? Há muitos salmos que nos ajudam a ir em frente. Adquiri o hábito de recitar os salmos, garanto-vos que no final sereis felizes.
Mas não podemos viver apenas da herança do passado: é necessário fazer dos salmos a nossa oração. Escreveu-se que, num certo sentido, devemos tornar-nos nós mesmos “autores” dos salmos, fazendo-os nossos e rezando com eles. [3] Se há salmos, ou apenas versículos, que falam ao nosso coração, é bom repeti-los e recitá-los durante o dia. Os salmos são orações “para todas as estações”: não há estado de espírito nem necessidade que não encontre neles as melhores palavras para os transformar em oração. Diversamente de todas as outras preces, os salmos não perdem a eficácia por causa da repetição, aliás, aumentam-na. Porquê? Porque são inspirados por Deus e “exalam” Deus cada vez que alguém os lê com fé.
Se nos sentimos sobrecarregados de remorsos e culpas, pois somos pecadores, podemos repetir com David: «Tende piedade de mim, ó Deus, no vosso amor; / na vossa grande misericórdia» (Sl 51, 3). Se quisermos exprimir uma forte ligação pessoal com Deus, digamos: «Ó Deus, Vós sois o meu Deus, / procuro-vos desde a aurora, / a minha alma tem sede de Vós, / a minha carne anseia por Vós / numa terra árida, sedenta, sem água» (Sl 63, 2). Não foi por acaso que a Liturgia inseriu este salmo nas Laudes do Domingo e das solenidades. E se o medo e a angústia nos assaltam, vêm em nosso socorro aquelas palavras maravilhosas: «O Senhor é o meu pastor [...]. Ainda que eu atravesse um vale escuro, / nada temerei» (Sl 23, 1.4).
Os salmos permitem-nos não empobrecer a nossa oração, reduzindo-a apenas a pedidos, a um contínuo “dai-me, dai-nos...”. Aprendamos com o nosso Pai, que antes de pedir o “pão nosso de cada dia” diz: “Santificado seja o vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade”. Os salmos ajudam-nos a abrir-nos a uma prece menos centrada em nós mesmos: uma oração de louvor, de bênção, de ação de graças; e ajudam-nos também a tornar-nos voz de toda a criação, envolvendo-a no nosso louvor.
Irmãos e irmãs, que o Espírito Santo, que ofereceu à Igreja Esposa as palavras para rezar ao seu divino Esposo, nos ajude a fazê-las ressoar na Igreja de hoje e a fazer deste ano de preparação para o Jubileu uma verdadeira sinfonia de oração.
Papa Francisco
Audiência geral 12.06.2024
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[1] Carta a D. Fisichella para o Jubileu de 2025 (11 de fevereiro de 2022).
[2] Comentário aos Salmos I, 4, 7: CSEL 64, 4-7.
[3] JOÃO CASSIANO, Conlationes, X, 11: SCh 54, 92-93.
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 3. “Toda a Escritura é inspirada por Deus”. Conhecer o amor de Deus nas palavras de Deus
Continuemos as catequeses sobre o Espírito Santo, que guia a Igreja para Cristo, nossa esperança. Ele é o guia! Da última vez contemplamos a obra do Espírito na criação; hoje vejamo-lo na revelação, da qual a Sagrada Escritura é testemunho inspirado por Deus e fidedigno.
A segunda carta de São Paulo a Timóteo contém esta afirmação: «Toda a Escritura é inspirada por Deus» (3, 16). E outra passagem do Novo Testamento diz: «Inspirados pelo Espírito Santo é que os homens... falaram em nome de Deus» (2 Pd 1, 21). Esta é a doutrina da inspiração divina da Escritura, aquela que proclamamos como artigo de fé no Credo, quando dizemos que o Espírito Santo «falou através dos profetas». A inspiração divina da Bíblia!
O Espírito Santo, que inspirou as Escrituras, é também Aquele que as explica e as torna perenemente vivas e ativas. De inspiradas, torna-as inspiradoras. «As Sagradas Escrituras, inspiradas por Deus - diz o Concílio Vaticano II - e redigidas de uma vez para sempre, comunicam imutavelmente a palavra do próprio Deus, fazendo ressoar a voz do Espírito Santo nas palavras dos profetas e dos apóstolos» (Dei Verbum, 21). Deste modo, o Espírito Santo continua, na Igreja, a ação de Jesus Ressuscitado que, depois da Páscoa, «abriu a mente dos discípulos à compreensão das Escrituras» (cf. Lc 24, 45).
Com efeito, pode acontecer que um determinado trecho da Escritura, que lemos muitas vezes sem qualquer emoção particular, um dia o leiamos num clima de fé e oração, e que, repentinamente, aquele texto se ilumine, nos fale, lance luz sobre um problema que vivemos, tornando clara a vontade de Deus para nós numa certa situação. A que se deve esta mudança, a não ser a uma iluminação do Espírito Santo? As palavras da Escritura, sob a ação do Espírito, tornam-se luminosas; e, em tais casos, toca-se com as próprias mãos como é verdadeira a afirmação da Carta aos Hebreus: «A palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes [...]» (4,12).
Irmãos e irmãs, a Igreja alimenta-se da leitura espiritual da Sagrada Escritura, isto é, da leitura feita sob a orientação do Espírito Santo que a inspirou. No seu centro, como farol que tudo ilumina, está o evento da morte e ressurreição de Cristo, que cumpre o desígnio da salvação, realiza todas as figuras e profecias, revela todos os mistérios escondidos, oferecendo a verdadeira chave de leitura de toda a Bíblia. A morte e a ressurreição de Cristo são o farol que ilumina toda a Bíblia, mas também a nossa vida. O Apocalipse descreve todo isto com a imagem do Cordeiro que rompe os selos do livro “escrito por dentro e por fora, mas sigilado com sete selos” (cf. 5, 1-9), a Escritura do Antigo Testamento. A Igreja, Esposa de Cristo, é intérprete fidedigna do texto inspirado da Escritura, a Igreja é medianeira da sua proclamação autêntica. Dado que a Igreja é dotada do Espírito Santo - por isso é intérprete - é «coluna e sustentáculo da verdade» (1 Tm 3, 15). Porquê? Porque é inspirada, corroborada pelo Espírito Santo. E a tarefa da Igreja consiste em ajudar os fiéis e quantos procuram a verdade a interpretar corretamente os textos bíblicos.
Um modo de fazer a leitura espiritual da Palavra de Deus chama-se lectio divina, uma expressão que talvez não entendamos o que significa. Consiste em dedicar um momento do dia à leitura pessoal e meditativa de uma passagem da Escritura. E isto é muito importante: todos os dias reservar um tempo para escutar, para meditar, lendo um trecho da Escritura. E por isso recomendo: tende sempre um Evangelho de bolso e levai-o na bolsa, no bolso... Assim, quando viajardes ou quando tiverdes um pouco de tempo livre, lede-o... Isto é muito importante para a vida! Pegai num Evangelho de bolso e, durante o dia, lede-o uma, duas vezes, quando for preciso. Mas a leitura espiritual da Escritura por excelência é a leitura comunitária que se faz na Liturgia, na Missa. Ali vemos como um acontecimento ou um ensinamento, dado no Antigo Testamento, encontra o seu pleno cumprimento no Evangelho de Cristo. E a homilia, o comentário que o celebrante faz, deve ajudar a transferir a Palavra de Deus do livro para a vida. Por isso, a homilia há de ser breve: uma imagem, um pensamento e um sentimento. A homilia não deve durar mais de oito minutos, porque depois, com o tempo, perde-se a atenção e as pessoas adormecem, e com razão. A homilia deve ser assim. E é isto que quero dizer aos sacerdotes, que tantas vezes falam muito, e não se entende o que dizem. Homilia breve: um pensamento, um sentimento e uma pista para a ação, para o modo de agir. Não mais de oito minutos. Pois a homilia deve ajudar a transferir a Palavra de Deus do livro para a vida. E entre as numerosas palavras de Deus que ouvimos todos os dias na Missa ou na Liturgia das horas, há sempre uma destinada em particular a nós. Algo que toca o coração! Acolhida no coração, pode iluminar o nosso dia, animar a nossa oração. Trata-se de não a deixar cair no vazio!
Concluamos com um pensamento que pode ajudar-nos a apaixonar-nos pela Palavra de Deus. Como certas peças musicais, também a Sagrada Escritura tem uma nota de fundo que a acompanha do princípio ao fim, e esta nota é o amor de Deus. «Toda a Bíblia - observa Santo Agostinho – só narra o amor de Deus». [1] E São Gregório Magno define a Escritura «uma carta de Deus todo-poderoso à sua criatura», como uma carta do Esposo à esposa, exortando-nos a «aprender a conhecer o coração de Deus nas palavras de Deus». [2] «Em virtude desta revelação – diz o Vaticano II - Deus invisível, na riqueza do seu amor fala aos homens como amigos e convive com eles para os convidar e admitir à comunhão com Ele» ( Dei Verbum, 2).
Prezados irmãos e irmãs, ide em frente com a leitura da Bíblia! Mas não vos esqueçais do Evangelho de bolso: levai-o na bolsa, no bolso e lede uma passagem num momento do dia. Isto aproximar-vos-á muito do Espírito Santo que está na Palavra de Deus. O Espírito Santo, que inspirou as Escrituras e agora emana das Escrituras, nos ajude a sentir este amor de Deus nas situações concretas da vida. Obrigado!
Papa Francisco
12.06.2024
Audiência Geral
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[1] De catechizandis rudibus, I, 8, 4: PL 40, 319.
[2] Registrum Epistolarum, V, 46 (ed. Ewald-Hartmann, pp. 345-346).
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 2. “O vento sopra onde quer”. Onde há o Espírito de Deus há liberdade
Na catequese de hoje, gostaria de refletir convosco sobre o nome com que o Espírito Santo é chamado na Bíblia.
O primeiro aspeto que conhecemos de uma pessoa é o nome. É com ele que a chamamos, que a distinguimos e a recordamos. A terceira pessoa da Trindade também tem um nome: chama-se Espírito Santo. Mas “Espírito” é a versão latinizada. O nome do Espírito, aquele com que os primeiros destinatários da revelação o conheceram, com que os profetas, os salmistas, Maria, Jesus e os Apóstolos o invocaram, é Ruach, que significa sopro, vento, respiro.
Na Bíblia, o nome é tão importante que quase se identifica com a própria pessoa. Santificar o nome de Deus significa santificar e honrar o próprio Deus. Nunca é uma designação meramente convencional: diz sempre algo sobre a pessoa, a sua origem, a sua missão. Assim é também no caso do nome Ruach. Ele contém a primeira revelação fundamental sobre a pessoa e a função do Espírito Santo.
Foi precisamente observando o vento e as suas manifestações que os escritores bíblicos foram orientados por Deus a descobrir um “vento” de natureza diferente. Não foi por acaso que, no Pentecostes, o Espírito Santo desceu sobre os Apóstolos acompanhado pelo “ruído de um vento impetuoso” (cf. At 2, 2). Era como se o Espírito Santo quisesse assinar o que acontecia.
Então, o que nos diz o seu nome Ruach sobre o Espírito Santo? A imagem do vento serve sobretudo para manifestar o poder do Espírito Santo. “Espírito e poder”, ou “poder do Espírito” é um binómio frequente em toda a Bíblia. Com efeito, o vento é uma força impetuosa, uma força indomável, capaz de mover até os oceanos.
Mas também neste caso, para descobrir o sentido pleno das realidades da Bíblia, não podemos limitar-nos ao Antigo Testamento, mas devemos chegar a Jesus. Além do poder, Jesus colocará em evidência outra caraterística do vento, a da sua liberdade. A Nicodemos, que o visita à noite, Jesus diz solenemente: «O vento sopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que nasceu do Espírito» (Jo 3, 8).
O vento é a única coisa que não pode absolutamente ser limitada, que não pode ser “engarrafada”, nem encaixotada. Procuremos “engarrafar” ou encaixotar o vento: não é possível, ele é livre! Procurar encerrar o Espírito Santo em conceitos, definições, teses ou tratados, como às vezes o racionalismo moderno procurou fazer, significa perdê-lo, anulá-lo ou reduzi-lo a um espírito puramente humano, a um simples espírito. Há, porém, uma tentação semelhante também no campo eclesiástico, que consiste em desejar encerrar o Espírito Santo em cânones, instituições, definições. O Espírito cria e anima as instituições, mas ele próprio não pode ser “institucionalizado”, “coisificado”. O vento sopra “onde quer”, assim o Espírito distribui os seus dons “como quer” (1 Cor 12, 11).
São Paulo fará de tudo isto a lei fundamental do agir cristão: «Onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade» (2 Cor 3, 17), diz. Uma pessoa livre, um cristão livre, é aquele que tem o Espírito do Senhor. Trata-se de uma liberdade muito especial, deveras diferente da que é geralmente entendida. Não é a liberdade de fazer o que se quer, mas a liberdade de fazer livremente o que Deus quer! Não é a liberdade de praticar o bem ou o mal, mas a liberdade de praticar o bem e de o fazer livremente, isto é, por atração, não por obrigação. Em síntese, liberdade de filhos, não de escravos!
São Paulo está bem consciente do abuso ou da incompreensão que se pode ter desta liberdade; aos Gálatas, escreve: «Vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Mas que esta liberdade não se torne um pretexto para a carne; através do amor, colocai-vos ao serviço uns dos outros» (Gl 5, 13). Trata-se de uma liberdade que se manifesta naquilo que parece ser o seu contrário, exprime-se no serviço, pois é no serviço que há a verdadeira liberdade.
Sabemos bem quando esta liberdade se torna um “pretexto para a carne”. Paulo apresenta uma lista, sempre atual: «Fornicação, impureza, devassidão, idolatria, feitiçaria, inimizade, discórdia, ciúme, dissensões, divisões, fações, invejas, bebedeiras, orgias e coisas semelhantes» (Gl 5, 19-21). Mas assim é a liberdade que permite aos ricos explorarem os pobres, é uma liberdade negativa, que permite aos fortes explorarem os fracos e a todos explorarem impunemente o meio ambiente. Trata-se de uma liberdade negativa, não é a liberdade do Espírito!
Irmãos e irmãs, onde encontramos esta liberdade do Espírito, tão contrária à liberdade do egoísmo? A resposta está nas palavras que, um dia, Jesus dirigiu aos seus ouvintes: «Se o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres» (Jo 8, 36). Esta é liberdade que Jesus nos concede. Peçamos a Jesus que, mediante o seu Espírito Santo, faça de nós homens e mulheres verdadeiramente livres. Livres para servir, no amor e naalegria. Obrigado!
Papa Francisco
05.06.2024
Audiência Geral
Ciclo de Catequese. O Espírito e a Esposa. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança. 1. O Espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas
Hoje, com esta catequese, damos início a um ciclo de reflexões sobre o tema “O Espírito e a Esposa - a Esposa é a Igreja. O Espírito Santo conduz o povo de Deus ao encontro de Jesus, nossa esperança”. Faremos este percurso através das três grandes etapas da história da salvação: o Antigo Testamento, o Novo Testamento e o tempo da Igreja. Sempre com o olhar fixo em Jesus, que é a nossa esperança.
Nestas primeiras catequeses sobre o Espírito no Antigo Testamento, não faremos “arqueologia bíblica”. Ao contrário, descobriremos que aquilo que é dado como promessa no Antigo Testamento se realizou plenamente em Cristo. Será como seguir o caminho do sol desde o amanhecer até ao meio-dia.
Comecemos pelos dois primeiros versículos de toda a Bíblia: «No princípio, Deus criou o céu e a terra. A terra era informe e deserta, e as trevas cobriam o abismo, e o Espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas» (Gn 1, 1-2). O Espírito de Deus aparece-nos como a força misteriosa que faz passar o mundo do seu estado inicial informe, deserto e sombrio para o seu estado ordenado e harmonioso. Porque o Espírito faz a harmonia, a harmonia na vida, a harmonia no mundo. Em síntese, é Ele que faz a transição do caos para o cosmos, isto é, da confusão para algo de belo e ordenado. Este é, com efeito, o significado da palavra grega kosmos, bem como da palavra latina mundus, ou seja, algo belo, algo ordenado, puro e harmonioso, porque o Espírito é harmonia.
Este indício ainda vago da ação do Espírito na criação torna-se mais preciso na revelação seguinte. Num salmo, lê-se: «Pela palavra do Senhor foram feitos os céus, pelo sopro dos seus lábios foram criados todos os seus exércitos» (Sl 33, 6); e ainda: «Se lhe enviais o Vosso espírito, voltam à vida, e renovais a face da terra» (Sl 104, 30).
Esta linha de desenvolvimento torna-se muito clara no Novo Testamento, que descreve a intervenção do Espírito Santo na nova criação, utilizando precisamente as imagens que lemos a propósito da origem do mundo: a pomba estava sobre as águas do Jordão no batismo de Jesus (cf. Mt 3,16); Jesus que, no Cenáculo, sopra sobre os discípulos e diz: «Recebei o Espírito Santo» (Jo 20, 22), tal como no princípio Deus soprou sobre Adão (cf. Gn 2, 7).
O apóstolo Paulo introduz um elemento novo nesta relação entre o Espírito Santo e a criação. Fala de um universo que «geme e sofre como que dores de parto» (cf. Rm 8, 22). Sofre por causa do homem, que o submeteu à «escravidão da corrupção» (cf. vv. 20-21). É uma realidade que nos toca de perto e de forma dramática. O Apóstolo vê a causa do sofrimento da criação na corrupção e no pecado da humanidade, que a arrastou para a sua alienação de Deus. Isto continua a ser tão verdadeiro hoje como era então. Vemos o dano que a humanidade fez e continua a fazer na criação, especialmente na parte que tem maior capacidade de explorar os seus recursos.
São Francisco de Assis mostra-nos uma bela solução para regressar à harmonia do Espírito: o caminho da contemplação e do louvor. Ele quis que das criaturas brotasse um cântico de louvor ao Criador. Recordemos: «Louvado sejas, meu Senhor...», o cântico de Francisco de Assis.
Um salmo (18, 2) diz assim: «Os céus narram a glória de Deus», mas precisam que o homem e a mulher deem voz ao seu grito silencioso. E no “Santo” da Missa, repetimos sempre: «Os céus e a terra estão cheios da tua glória». Eles estão, por assim dizer, “grávidos” dela, mas precisam das mãos de uma boa parteira para dar à luz este seu louvor. A nossa vocação no mundo, recorda-nos ainda Paulo, é sermos «louvor da sua glória» (Ef 1, 12). Trata-se de antepor a alegria da contemplação à alegria da posse. E ninguém se alegrou mais com as criaturas do que Francisco de Assis, que não queria possuir nenhuma.
Irmãos e irmãs, o Espírito Santo, que no princípio transformou o caos em cosmos, trabalha para realizar esta transformação em cada pessoa. Através do profeta Ezequiel, Deus promete: «Dar-vos-ei um coração novo, porei em vós um Espírito novo... Porei em vós o meu Espírito» (Ez 36, 26-27). Com efeito, o nosso coração assemelha-se ao abismo deserto e obscuro dos primeiros versículos do Génesis. Nele agitam-se sentimentos e desejos opostos: da carne e do espírito. Num certo sentido, todos nós somos aquele “reino dividido em si mesmo” de que fala Jesus no Evangelho (cf. Mc 3, 24). Ao nosso redor, podemos dizer que existe um caos externo, um caos social, um caos político: pensemos nas guerras, pensemos em tantos meninos e meninas que não têm o que comer, em tantas injustiças sociais, este é o caos externo. Mas há também um caos interior: o caos interior de cada um de nós. Não se pode curar o primeiro, se não se começar a curar o segundo! Irmãos e irmãs, trabalhemos bem para transformar a nossa confusão interior numa claridade do Espírito Santo: é o poder de Deus que o faz; e nós, abramos o coração para que Ele o possa fazer.
Que esta reflexão suscite em nós o desejo de experimentar o Espírito criador. Há mais de mil anos que a Igreja põe nos nossos lábios o clamor, para o pedir: “Veni creator Spiritus!”, Vem, ó Espírito criador! Visita a nossa mente. Enche de graça celeste os corações que criaste! Peçamos ao Espírito Santo que venha a nós e nos torne pessoas novas, com a novidade do Espírito. Obrigado!
Papa Francisco
29.05.2024
Audiência geral
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 20. A humildade
Concluímos este ciclo de catequeses meditando sobre uma virtude que não faz parte do septenário de virtudes cardeais e teologais, mas que está na base da vida cristã: esta virtude é a humildade. Ela é a grande antagonista do mais mortal dos vícios, a soberba. Enquanto o orgulho e a soberba inflam o coração humano, fazendo-nos parecer mais do que somos, a humildade repõe tudo na dimensão certa: somos criaturas maravilhosas mas limitadas, com qualidades e defeitos. A Bíblia recorda-nos desde o início que somos pó e ao pó voltaremos (cf. Gn 3, 19); com efeito, “humilde” vem de húmus, ou seja, terra. No entanto, no coração humano surgem com frequência delírios de omnipotência, muito perigosos, e isto fere-nos muito.
Para nos libertarmos do orgulho, bastaria deveras pouco, seria suficiente contemplar um céu estrelado para recuperar a medida certa, como reza o Salmo: «Quando contemplo o firmamento, obra das vossas mãos, a lua e as estrelas que fixastes, que é o homem para que vos lembrardes dele, o filho do homem para dele cuidardes?» (8, 4-5). A ciência moderna permite-nos ampliar muito mais o horizonte e sentir em maior medida o mistério que nos circunda e habita.
Felizes as pessoas que conservam no coração esta consciência da sua pequenez! Estas pessoas são preservadas de um vício tremendo: a arrogância. Nas suas bem-aventuranças, Jesus parte precisamente delas: «Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos céus» (Mt 5, 3). É a primeira bem-aventurança, pois está na base das seguintes: com efeito, a mansidão, a misericórdia, a pureza de coração nascem desta sensação interior de pequenez. A humildade é a porta de entrada para todas as virtudes!
Nas primeiras páginas dos Evangelhos, a humildade e a pobreza de espírito parecem ser a fonte de tudo. O anúncio do anjo não se verifica às portas de Jerusalém, mas num povoado remoto da Galileia, tão insignificante que as pessoas diziam: «Pode vir algo bom de Nazaré?» (Jo 1, 46). Mas é precisamente dali que o mundo renasce. A heroína escolhida não é uma pequena rainha que cresceu na infantilidade, mas uma jovem desconhecida: Maria. A primeira a ficar abismada é ela própria, quando o anjo lhe traz o anúncio de Deus. E no seu cântico de louvor sobressai exatamente este enlevo: «A minha alma engrandece o Senhor e o meu espírito exulta em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade da sua serva» (Lc 1, 46-48). Deus - por assim dizer - é atraído pela pequenez de Maria, que é sobretudo pequenez interior. E é atraído também pela nossa pequenez, quando a aceitamos.
Daqui em diante, Maria terá o cuidado de não pisar o palco. A sua primeira decisão após o anúncio angélico é ir ajudar, ir servir a prima. Maria vai às montanhas de Judá, para visitar Isabel: assiste-a nos últimos meses de gravidez. Mas quem vê este gesto? Ninguém, a não ser Deus. A Virgem parece nunca querer sair deste escondimento. Como quando, do meio da multidão, a voz de uma mulher proclama a sua bem-aventurança: «Bendito o ventre que te deu à luz e o seio que te amamentou!» (Lc 11, 27). Mas Jesus responde imediatamente: «Bem-aventurados os que ouvem a palavra de Deus e a observam» (Lc 11, 28). Nem sequer a verdade mais sagrada da sua vida - ser Mãe de Deus - se torna para ela motivo de vanglória diante dos homens. Num mundo que busca a aparência, para se demonstrar superior aos outros, Maria caminha com determinação, só com a força da graça de Deus, na direção oposta.
Podemos imaginar que também ela conheceu momentos difíceis, dias em que a sua fé avançava na escuridão. Mas isto nunca fez vacilar a sua humildade, que em Maria era uma virtude granítica. Quero frisá-lo: a humildade é uma virtude granítica! Pensemos em Maria: ela é sempre pequena, sempre despojada de si mesma, sempre livre de ambições. Esta sua pequenez é a sua força invencível: é ela que permanece aos pés da cruz, enquanto se fragmenta a ilusão de um Messias triunfante. Será Maria, nos dias precedentes ao Pentecostes, que reunirá o rebanho dos discípulos que não foram capazes de vigiar uma só hora com Jesus e que o abandonaram quando chegou a tempestade.
Irmãos e irmãs, a humildade é tudo. É ela que nos salva do Maligno e do perigo de nos tornarmos seus cúmplices. E a humildade é a nascente da paz no mundo e na Igreja. Onde não há humildade, há guerra, há discórdia, há divisão. Deus deu-nos o exemplo disto em Jesus e Maria, a fim de que seja a nossa salvação e a nossa felicidade. E a humildade é precisamente a vereda, o caminho da salvação. Obrigado!
Papa Francisco
Audiência Geral 22.05.2024
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 19. A caridade
Hoje falaremos da terceira virtude teologal, a caridade. As outras duas, recordemos, são a fé e a esperança: hoje falaremos da terceira, a caridade. Ela é o ápice de todo o itinerário que percorremos nas catequeses sobre as virtudes. Pensar na caridade dilata imediatamente o coração e a mente, segundo as palavras inspiradas de São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios. Concluindo aquele maravilhoso hino, São Paulo cita a tríade de virtudes teologais, exclamando: «Agora, pois, subsistem estas três coisas: a fé, a esperança e a caridade. Mas a maior de todas é a caridade» (1 Cor 13, 13).
Paulo dirige estas palavras a uma comunidade muito longe de ser perfeita no amor fraterno: os cristãos de Corinto eram bastante turbulentos, havia divisões internas, havia aqueles que pretendiam ter sempre razão e não ouviam os outros, considerando-os inferiores. Paulo recorda-lhes que a ciência ensoberbece, enquanto a caridade edifica (cf. 1 Cor 8, 1). Além disso, o Apóstolo fala de um escândalo que atinge até o momento de maior união de uma comunidade cristã, ou seja, a “ceia do Senhor”, a celebração eucarística: também aí há divisões, e há quem se aproveite para comer e beber, excluindo os que nada têm (cf. 1 Cor 11, 18-22). Perante isto, Paulo pronuncia um juízo severo: «Quando, pois, vos reunis, já não comeis a ceia do Senhor» (v. 20), tendes outro ritual, que é pagão, não é a ceia do Senhor.
Quem sabe, talvez ninguém na comunidade de Corinto pensasse que tinha cometido pecado e aquelas palavras tão duras do Apóstolo lhes parecessem um pouco incompreensíveis. Provavelmente todos estavam convencidos de que eram pessoas bondosas e, se fossem interrogados sobre o amor, teriam respondido que para eles o amor era certamente um valor muito importante, como a amizade e a família. Até hoje o amor está nos lábios de todos, na boca de muitos “influencers” e nos refrões de numerosas canções. Fala-se muito de amor, mas o que é o amor?
“Mas o outro amor?”, parece perguntar Paulo aos seus cristãos de Corinto. Não o amor que sobe, mas aquele que desce; não o que toma, mas aquele que oferece; não o que aparece, mas aquele que se esconde. Paulo receia que em Corinto - como também entre nós hoje - se crie confusão e que da virtude teologal do amor, que só vem de Deus, não permaneça na realidade vestígio algum. E, embora todos afirmem ser pessoas bondosas, que amam a própria família e os amigos, na verdade sabem muito pouco sobre o amor de Deus.
Os cristãos da antiguidade tinham à disposição várias palavras gregas para definir o amor. No final, surgiu o vocábulo “ágape”, que normalmente traduzimos como “caridade”. Porque, na verdade, os cristãos são capazes de todos os amores do mundo: também eles se apaixonam, mais ou menos como acontece com todos. Também eles experimentam a benevolência da amizade. Também eles vivem o amor à pátria e o amor universal a toda a humanidade. Mas existe um amor maior, um amor que vem de Deus e se dirige a Deus, que nos permite amar a Deus, tornando-nos seus amigos, e nos concede amar o próximo como Deus o ama, com o desejo de partilhar a amizade com Deus. Por causa de Cristo, este amor impele-nos para onde humanamente não iríamos: trata-se do amor pelos pobres, pelo que não é amável, por quem não nos ama e não nos é grato. É o amor pelo que ninguém amaria; até pelo inimigo. Até pelo inimigo. Isto é “teologal”, vem de Deus, é obra do Espírito Santo em nós.
No sermão da montanha Jesus prega: «Se amardes aqueles que vos amam, que gratidão vos será devida? Até os pecadores amam aqueles que os amam. E se fizerdes o bem a quem vos faz o bem, que gratidão vos é devida? Até os pecadores fazem o mesmo» (Lc 6, 32-33). E conclui: «Amai, pois, os vossos inimigos - estamos habituados a falar mal dos inimigos - amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem nada esperar, e a vossa recompensa será grande, e sereis filhos do Altíssimo, porque Ele tem piedade dos ingratos e dos malvados» (v. 35). Recordemo-lo: “Amai, pois, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem nada esperar”. Não o esqueçamos!
Nestas palavras, o amor revela-se como virtude teologal, adquirindo o nome de caridade. O amor é caridade! Compreendemos imediatamente que se trata de um amor difícil, aliás, impossível de praticar, se não se vive em Deus. A nossa natureza humana leva-nos a amar espontaneamente o que é bom e belo. Em nome de um ideal ou de um grande afeto, até conseguimos ser generosos e realizar gestos heroicos. Mas o amor de Deus vai além destes critérios. O amor cristão abraça o que não é amável, oferece o perdão - como é difícil perdoar, quanto amor é preciso para perdoar! - o amor cristão abençoa quem amaldiçoa, enquanto nós estamos habituados, perante um insulto ou uma maldição, a responder com outro insulto, com outra maldição. É um amor tão audacioso que parece quase impossível e, no entanto, é a única coisa que restará de nós. O amor é a “porta estreita” através da qual passar para entrar no Reino de Deus. Pois no crepúsculo da vida não seremos julgados pelo amor genérico, seremos julgados precisamente pela caridade, pelo amor que tivermos concretamente. E Jesus diz-nos isto, é muito bonito: «Em verdade vos digo: tudo o que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes» (Mt 25, 40). Esta é a beleza, a grandiosidade do amor. Em frente e coragem!
Papa Francisco
Audiência Geral 15.05.2024
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 18. A esperança
Na última catequese, demos início à reflexão sobre as virtudes teologais. São três: fé, esperança e caridade. Da última vez refletimos sobre a fé, hoje é a vez da esperança. «A esperança é a virtude teologal pela qual desejamos o Reino dos céus e a vida eterna como nossa felicidade, pondo toda a nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos não nas nossas forças, mas no socorro da graça do Espírito Santo» (Catecismo da Igreja Católica, n. 1817). Estas palavras confirmam-nos que a esperança é a resposta oferecida ao nosso coração, quando brota em nós a pergunta absoluta: “Que será de mim? Qual é a meta da viagem? Qual é o destino do mundo?”.
Todos compreendemos que uma resposta negativa a estas perguntas produz tristeza. Se o caminho da vida não tem sentido, se não há nada no princípio e no fim, então perguntamo-nos por que deveríamos caminhar: daqui nasce o desespero do homem, a sensação da inutilidade de tudo. E muitos poderiam revoltar-se: esforcei-me por ser virtuoso, prudente, justo, forte, temperante. Fui também um homem ou uma mulher de fé... De que serviu o meu combate, se tudo acaba aqui? Se faltar a esperança, todas as outras virtudes correm o risco de se desmoronar e de acabar em cinzas. Se não existisse um amanhã fiável, um horizonte resplandecente, não restaria que concluir que a virtude é um esforço inútil. «Somente quando o futuro é certo como realidade positiva, é que se torna vivível também o presente», dizia Bento XVI (Carta Encíclica Spe salvi, 2).
O cristão tem esperança não por mérito próprio. Se acredita no futuro, é porque Cristo morreu, ressuscitou e nos concedeu o seu Espírito. «A redenção é-nos oferecida no sentido que nos foi dada a esperança, uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo presente» (ibid., 1). Neste sentido, dizemos mais uma vez que a esperança é uma virtude teologal: não deriva de nós, não é uma obstinação de que nos queremos convencer, mas sim um dom que vem diretamente de Deus.
A muitos cristãos céticos, que não tinham renascido completamente para a esperança, o apóstolo Paulo apresenta a nova lógica da experiência cristã: «Se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, e ainda viveis nos vossos pecados. Por isso, até os que morreram em Cristo pereceram. Se tão somente nesta vida esperarmos em Cristo, somos os mais miseráveis de todos os homens» (1 Cor 15, 17-19). É como se dissesse: se acreditares na ressurreição de Cristo, então sabes com certeza que nenhuma derrota, nenhuma morte é para sempre. Mas se não acreditares na ressurreição de Cristo, então tudo se torna vazio, até a pregação dos Apóstolos.
A esperança é uma virtude contra a qual pecamos frequentemente: nas nossas saudades negativas, nas nossas melancolias, quando pensamos que as felicidades do passado estão enterradas para sempre. Pecamos contra a esperança, quando desanimamos diante dos nossos pecados, esquecendo que Deus é misericordioso e é maior do que o nosso coração. Não esqueçamos isto, irmãos e irmãs: Deus perdoa tudo, Deus perdoa sempre. Somos nós que nos cansamos de pedir perdão. Mas não esqueçamos esta verdade: Deus perdoa tudo, Deus perdoa sempre! Pecamos contra a esperança, quando desanimamos perante os nossos pecados; pecamos contra a esperança, quando o outono anula em nós a primavera; quando o amor de Deus deixa de ser um fogo eterno e não temos a coragem de tomar decisões que nos comprometem para toda a vida.
O mundo de hoje tem muita necessidade desta virtude cristã! O mundo precisa da esperança, assim como tem tanta necessidade da paciência, uma virtude que caminha de mãos dadas com a esperança. Os homens pacientes são tecelões de bem. Desejam obstinadamente a paz, e embora alguns tenham pressa e queiram tudo e já, a paciência tem a capacidade da espera. Até quando muitos à sua volta cederam à desilusão, quem é animado pela esperança e é paciente, torna-se capaz de atravessar as noites mais escuras. Esperança e paciência caminham de mãos dadas!
A esperança é a virtude de quem é jovem de coração; e nisto, a idade não conta. Porque existem até velhos com os olhos cheios de luz, que vivem em tensão permanente para o futuro. Pensemos naqueles dois grandes anciãos do Evangelho, Simeão e Ana: nunca se cansaram de esperar e viram o último trecho do seu caminho abençoado pelo encontro com o Messias, que reconheceram em Jesus, levado ao Templo pelos seus pais. Que felicidade, se fosse assim para todos nós! Se, depois de uma longa peregrinação, pousando alforge e cajado, o nosso coração se enchesse de uma alegria nunca antes sentida e também nós pudéssemos exclamar: «Agora, Senhor, podes deixar o teu servo / ir em paz, segundo a tua palavra, / porque os meus olhos viram a tua salvação, / preparada por ti diante de todos os povos: / luz para te revelar às nações / e glória para o teu povo, Israel» (Lc 2, 29-32).
Irmãos e irmãs, vamos em frente e peçamos a graça de ter esperança, esperança com paciência. Olhar sempre para o encontro definitivo; pensar sempre que o Senhor está perto de nós, que a morte nunca, nunca será vencedora! Vamos em frente e peçamos ao Senhor que nos conceda esta grande virtude da esperança, acompanhada pela paciência. Obrigado!
Papa Francisco
Audiência geral 8.05.2024
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Catequeses. Os vícios e as virtudes. 17. A fé
Hoje gostaria de falar sobre a virtude da fé. Com a caridade e a esperança, esta virtude é chamada “teologal”. São três as virtudes teologais: fé, esperança e caridade. Por que são teologais? Porque só podem ser vividas graças ao dom de Deus. As três virtudes teologais são os grandes dons que Deus concede à nossa capacidade moral. Sem elas, poderíamos ser prudentes, justos, fortes e temperantes, mas não teríamos olhos que veem até no escuro, não teríamos um coração que ama até quando não é amado, não teríamos uma esperança que ousa contra toda a esperança.
O que é a fé? O Catecismo da Igreja Católica explica-nos que a fé é o ato com que o ser humano se abandona livremente a Deus (n. 1814). Nesta fé, Abraão foi o grande pai. Quando aceitou deixar a terra dos seus antepassados para se dirigir rumo à terra que Deus lhe teria indicado, provavelmente foi julgado louco: por que deixar o conhecido pelo desconhecido, o certo pelo incerto? Por que fazer isto? É louco? Mas Abraão põe-se a caminho, como se visse o invisível. É o que a Bíblia diz de Abraão: “Partiu, como se visse o invisível”. Isto é lindo! E será ainda este invisível que o fará subir à montanha com o seu filho Isaac, o único filho da promessa, que só no último momento será poupado ao sacrifício. Nesta fé, Abraão torna-se o pai de uma longa linhagem de filhos. A fé tornou-o fecundo.
Homem de fé será Moisés que, aceitando a voz de Deus até quando mais do que uma dúvida o podia abalar, continuou a manter-se firme e a confiar no Senhor, e até a defender o povo a quem, pelo contrário, muitas vezes faltava a fé.
Mulher de fé será a Virgem Maria que, recebendo o anúncio do Anjo, que muitos teriam rejeitado como demasiado exigente e arriscado, responde: «Eis a serva do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1, 38). E com o coração cheio de fé, com o coração repleto de confiança em Deus, Maria põe-se a caminho por uma estrada da qual não conhece nem o trajeto nem os perigos.
A fé é a virtude que faz o cristão. Pois ser cristão não consiste antes de mais em aceitar uma cultura, com os valores que a acompanham, mas ser cristão significa acolher e preservar um vínculo, um vínculo com Deus: eu e Deus; a minha pessoa e o rosto amável de Jesus. É este vínculo que nos torna cristãos.
A propósito de fé, vem-me à mente um episódio do Evangelho. Os discípulos de Jesus atravessam o lago e são surpreendidos por uma tempestade. Pensam que conseguirão salvar-se com a força dos seus braços, com os recursos da experiência, mas o barco começa a encher-se de água e entram em pânico (cf. Mc 4, 35-41). Não se dão conta de que têm a solução diante dos olhos: Jesus está ali com eles no barco, no meio da tempestade, e Jesus dorme, diz o Evangelho. Quando finalmente o acordam, assustados e até zangados porque Ele os deixa morrer, Jesus repreende-os: «Por que tendes medo? Ainda não tendes fé?» (Mc 4, 40).
Eis, portanto, o grande inimigo da fé: não é a inteligência, não é a razão, como, infelizmente, alguns continuam a repetir obsessivamente, mas o grande inimigo da fé é o medo. Por isso, a fé é o primeiro dom a receber na vida cristã: um dom que deve ser acolhido e pedido diariamente, para que se renove em nós. Aparentemente, é um dom pequeno, mas é essencial. Quando fomos levados à pia batismal, os nossos pais, depois de terem anunciado o nome que tinham escolhido para nós, foram interrogados pelo sacerdote – foi isto que aconteceu no nosso Batismo - «O que pedis à Igreja de Deus?». E os pais responderam: «A fé, o batismo!».
Para um pai cristão, consciente da graça que lhe foi concedida, é este o dom a pedir também para o seu filho: a fé. Com ela, o pai sabe que, até no meio das provações da vida, o seu filho não se afogará no medo. Eis, o inimigo é o medo. Sabe também que, quando deixar de ter um pai nesta terra, continuará a ter um Deus Pai no céu, que nunca o abandonará. O nosso amor é tão frágil, e só o amor de Deus vence a morte!
Certamente, como diz o Apóstolo, a fé não é de todos (cf. 2 Ts 3, 2), e até nós, que somos crentes, muitas vezes sentimos que a temos em pouca quantidade. Muitas vezes, Jesus pode repreender-nos, como fez com os seus discípulos, por sermos “homens de pouca fé”. No entanto, é o dom mais feliz, a única virtude que nos é permitido invejar. Pois quem tem fé é habitado por uma força que não é apenas humana; com efeito, a fé “desencadeia” em nós a graça e abre a mente ao mistério de Deus. Como certa vez Jesus disse: «Se tivésseis fé como um grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: “Desarraiga-te e planta-te no mar”, e ela obedecer-vos-ia» (Lc 17, 6). Por isso, também nós, como os discípulos, lhe repetimos: Senhor, aumenta a nossa fé! (cf. Lc 17, 5) É uma linda oração! Digamo-la todos juntos? “Senhor, aumenta a nossa fé”. Digamo-la juntos: [todos] “Senhor, aumenta a nossa fé”. Demasiado fraco, um pouco mais alto: [todos] “Senhor, aumenta a nossa fé!”. Obrigado!
Papa Francisco
Audiência Geral 02.05.2024
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Catequeses. Os vícios e as virtudes. 16. A vida da graça segundo o Espírito
Nas últimas semanas, refletimos sobre as virtudes cardeais: prudência, justiça, fortaleza e temperança. São estas as quatro virtudes cardeais. Como já salientamos várias vezes, estas quatro virtudes pertencem a uma sabedoria muito antiga, estas quatro virtudes pertencem a uma sabedoria muito antiga, precedente até ao cristianismo. Já antes de Cristo, a honestidade era preconizada como dever cívico, a sabedoria como regra das ações, a coragem como ingrediente fundamental para uma vida que tende para o bem, e a moderação como medida necessária para não se deixar dominar pelos excessos. Esta herança tão antiga, legado da humanidade, não foi substituída pelo cristianismo, mas esclarecida, valorizada, purificada e integrada na fé.
Portanto, no coração de cada homem e mulher existe a capacidade de procurar o bem. O Espírito Santo é concedido para que quantos o recebem possam distinguir claramente o bem do mal, ter a força de aderir ao bem evitando o mal e, agindo assim, alcançar a plena realização pessoal.
Mas no caminho que todos percorremos rumo à plenitude da vida, que pertence ao destino de cada pessoa - o destino de cada pessoa é a plenitude, ser cheia de vida - o cristão goza de uma ajuda especial do Espírito Santo, o Espírito de Jesus. Ela é implementada com o dom de outras três virtudes, distintamente cristãs, que nos escritos do Novo Testamento são frequentemente mencionadas juntas. Estas atitudes fundamentais, que distinguem a vida do cristão, são três virtudes que agora diremos juntos: fé, esperança e caridade. Digamo-las juntos: [juntos] Fé, esperança... não ouço nada, mais alto! [juntos] Fé, esperança e caridade. Muito bem! Os escritores cristãos chamaram-lhes depressa virtudes “teologais”, dado que são recebidas e vividas na relação com Deus, para as diferenciar das outras quatro virtudes chamadas “cardeais”, uma vez que constituem a “charneira” de uma vida boa. Estas três são recebidas no Batismo e derivam do Espírito Santo. Todas, tanto as teologais como as cardeais, confrontadas em muitas reflexões sistemáticas, compuseram assim um maravilhoso septenário, que muitas vezes é oposto ao elenco dos sete vícios capitais. É assim que o Catecismo da Igreja Católica define a ação das virtudes teologais: «Fundamentam, animam e caraterizam o agir moral do cristão. Informam e vivificam todas as virtudes morais. São infundidas por Deus na alma dos fiéis para os tornar capazes de proceder como filhos seus e assim merecerem a vida eterna. São o penhor da presença e da ação do Espírito Santo nas faculdades do ser humano» (n. 1813).
Enquanto o risco das virtudes cardeais consiste em gerar homens e mulheres heroicos na prática do bem, mas em última análise sozinhos, isolados, o grande dom das virtudes teologais é a existência vivida no Espírito Santo. O cristão nunca está sozinho. Pratica o bem não por um esforço titânico de empenhamento pessoal, mas porque, como discípulo humilde, caminha atrás do Mestre Jesus. Ele vai à frente ao longo do caminho. O cristão possui as virtudes teologais que são o grande antídoto contra a autossuficiência. Quantas vezes certos homens e mulheres moralmente irrepreensíveis correm o risco de se tornarem presunçosos e arrogantes aos olhos de quem os conhece! É um perigo contra o qual bem nos alerta o Evangelho, onde Jesus recomenda aos discípulos: «Também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: “Somos servos inúteis, fizemos o que devíamos fazer”» (Lc 17, 10). A soberba é um veneno, um veneno poderoso: basta uma gota para estragar toda uma vida marcada pelo bem. Uma pessoa pode ter praticado uma montanha de boas ações, pode ter recebido reconhecimentos e louvores, mas se fez tudo isto apenas para si própria, para se exaltar, ainda pode dizer-se uma pessoa virtuosa? Não!
O bem não é apenas um fim, mas também um modo. O bem precisa de muita discrição, de muita gentileza. O bem tem necessidade sobretudo de se despojar desta presença às vezes demasiado incómoda que é o nosso “eu”. Quando o nosso “eu” está no centro de tudo, estraga tudo. Se cada ação que realizarmos na vida for apenas para nós próprios, é realmente tão importante esta motivação? O pobre “eu” apodera-se de tudo e assim nasce a soberba.
Para corrigir todas estas situações, que às vezes se tornam penosas, as virtudes teologais são de grande ajuda. São-no sobretudo nos momentos de queda, pois às vezes até aqueles que têm bons propósitos morais caem. Na vida todos caímos, porque todos somos pecadores. Tal como até os que praticam diariamente a virtude às vezes erram - todos erramos na vida - a inteligência nem sempre é lúcida, a vontade nem sempre é firme, as paixões nem sempre são governadas, a coragem nem sempre vence o medo. Mas se abrirmos o coração ao Espírito Santo - Mestre interior - Ele reaviva em nós as virtudes teologais: assim, se perdemos a confiança, Deus reabre-nos à fé - com a força do Espírito; se estamos desanimados, Deus reabre-nos à fé, se estamos desencorajados Deus desperta em nós a esperança; e se o nosso coração está empedernido, Deus suaviza-o com o seu amor. Obrigado!
Papa Francisco
Audiência geral 24.04.2024
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 14. A fortaleza
A catequese de hoje é dedicada à terceira das virtudes cardeais, ou seja, a fortaleza. Comecemos pela descrição dada pelo Catecismo da Igreja Católica: «A fortaleza é a virtude moral que, no meio das dificuldades, assegura a firmeza e a constância na prossecução do bem. Torna firme a decisão de resistir às tentações e de superar os obstáculos na vida moral. A virtude da fortaleza dá capacidade para vencer o medo, até da morte, e enfrentar a provação e as perseguições» (n. 1808). Assim diz o Catecismo da Igreja Católica sobre a virtude da fortaleza.
Eis, pois, a mais “combativa” das virtudes. Enquanto a primeira das virtudes cardeais, isto é, a prudência, estava principalmente associada à razão do homem; e enquanto a justiça encontrava a sua morada na vontade, esta terceira virtude, a fortaleza, é frequentemente ligada pelos autores escolásticos àquilo a que os antigos chamavam o “apetite irascível”. O pensamento antigo não imaginava um homem desprovido de paixões: seria uma pedra. E as paixões não são necessariamente o resíduo de um pecado; mas devem ser educadas, devem ser orientadas, devem ser purificadas com a água do Batismo, ou melhor, com o fogo do Espírito Santo. O cristão sem coragem, que não inclina as próprias forças para o bem, que não incomoda ninguém, é um cristão inútil. Pensemos nisto! Jesus não é um Deus diáfano e assético, que desconhece as emoções humanas. Pelo contrário. Perante a morte do amigo Lázaro, desata em lágrimas; e em algumas das suas expressões transparece o seu espírito apaixonado, como quando diz: «Vim lançar fogo sobre a terra, e como gostaria que já se tivesse ateado!» (Lc 12, 49); e diante do comércio no templo, reage vigorosamente (cf. Mt 21, 12-13). Jesus tinha paixão!
Mas vejamos agora uma descrição existencial desta virtude tão importante que nos ajuda a dar frutos na vida. Os antigos - tanto os filósofos gregos como os teólogos cristãos - reconheciam na virtude da fortaleza um duplo desenvolvimento, um passivo, outro ativo.
O primeiro ocorre dentro de nós mesmos. Há inimigos internos que devemos derrotar, e o seu nome é ansiedade, angústia, medo, culpa: todas estas forças que se agitam no nosso íntimo e que, em certas situações, nos paralisam. Quantos combatentes sucumbem até antes de começar o desafio! Porque desconhecem estes inimigos interiores. A fortaleza é, antes de tudo, uma vitória contra nós próprios. A maior parte dos medos que surgem dentro de nós são irrealistas e não se concretizam de forma alguma. É melhor então invocar o Espírito Santo e enfrentar tudo com fortaleza paciente: um problema de cada vez, como formos capazes, mas não sozinhos! O Senhor está ao nosso lado, se confiarmos nele e procurarmos sinceramente o bem. Então, em todas as situações, podemos contar com a Providência de Deus para nos amparar e blindar.
E depois o segundo movimento da virtude da fortaleza, desta vez de natureza mais ativa. Além das provações internas, existem os inimigos externos, que são as provações da vida, as perseguições, as dificuldades que não esperávamos e que nos surpreendem. Com efeito, podemos procurar prever o que nos vai acontecer, mas a realidade é, em grande medida, feita de acontecimentos imponderáveis e, neste mar, às vezes, o nosso barco é arrastado pelas ondas. Assim, a fortaleza faz de nós marinheiros resistentes, que não se amedrontam nem desanimam.
A fortaleza é uma virtude fundamental porque leva a sério o desafio do mal no mundo. Alguns fingem que ele não existe, que tudo está bem, que a vontade humana não é por vezes cega, que as forças obscuras que trazem a morte não se debatem na história. Mas é suficiente folhear um livro de história, ou infelizmente até os jornais, para descobrir os atos nefastos de que somos em parte vítimas e em parte protagonistas: guerras, violências, escravatura, opressão dos pobres, feridas que nunca cicatrizaram e continuam a sangrar. A virtude da fortaleza faz-nos reagir e gritar “não”, um “não” categórico a tudo isto. No nosso Ocidente confortável, que diluiu um pouco tudo, transformando o caminho da perfeição num simples desenvolvimento orgânico, que não tem necessidade de lutar porque tudo lhe parece igual, às vezes sentimos uma saudável nostalgia dos profetas. Mas as pessoas importunas e visionárias são deveras raras. É preciso que alguém nos faça sair do lugar macio onde nos estabelecemos e nos obrigue a repetir resolutamente o nosso “não” ao mal e a tudo aquilo que conduz à indiferença. “Não” ao mal, “não” à indiferença; “sim” ao caminho, ao caminho que nos leva a progredir, e pelo qual devemos lutar.
Então, voltemos a descobrir no Evangelho a fortaleza de Jesus, aprendendo-a com o testemunho dos santos e santas. Obrigado!
Papa Francisco
Audiência geral 10.04.24
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 15. A temperança
Hoje falarei sobre a quarta e última virtude cardeal: a temperança. Com as outras três, esta virtude partilha uma história muito antiga e não pertence unicamente aos cristãos. Para os gregos, a prática das virtudes tinha como objetivo a felicidade. O filósofo Aristóteles escreve o seu mais importante tratado de ética, dirigindo-o ao filho Nicómaco, para o instruir na arte de viver. Por que todos nós procuramos a felicidade e tão poucos a alcançam? Eis a pergunta. Para lhe responder, Aristóteles aborda o tema das virtudes, entre as quais ocupa um espaço de relevo a enkráteia, ou seja, a temperança. O termo grego significa literalmente “poder sobre si mesmo”. A temperança é o poder sobre si mesmo. Portanto, esta virtude é a capacidade de autodomínio, a arte de não se deixar arrebatar por paixões rebeldes, de pôr ordem naquilo a que Manzoni chama a “desordem do coração humano”.
O Catecismo da Igreja Católica diz-nos que «a temperança é a virtude moral que modera a atração dos prazeres e proporciona o equilíbrio no uso dos bens criados». «Assegura, acrescenta o Catecismo, o domínio da vontade sobre os instintos e mantém os desejos nos limites da honestidade. A pessoa temperante orienta para o bem os apetites sensíveis, guarda uma sã discrição e não se deixa arrastar pelas paixões do coração» (n. 1809).
Por conseguinte, a temperança, como diz a palavra, é a virtude da medida certa. Em todas as situações, comporta-se com sabedoria, porque as pessoas que agem sempre movidas pelo ímpeto ou pela exuberância acabam por ser inconfiáveis. As pessoas sem temperança são sempre inconfiáveis. Num mundo onde tanta gente se gaba de dizer o que pensa, a pessoa temperante prefere, ao contrário, pensar no que diz. Compreendeis a diferença? Não dizer o que me vem à mente, assim... Não, pensar no que devo dizer. Não fazer promessas superficiais, mas assumir compromissos na medida em que os pudermos cumprir.
Inclusive em relação aos prazeres, a pessoa temperante age com juízo. O livre curso dos impulsos e a total licença concedida aos prazeres acabam por se virar contra nós próprios, levando-nos a precipitar num estado de tédio. Quantas pessoas que quiseram experimentar tudo vorazmente acabaram por perder o gosto por tudo! Então, é melhor procurar a medida certa: por exemplo, para apreciar um bom vinho, é melhor saboreá-lo em pequenos goles do que engoli-lo de uma só vez. Todos nós sabemos isto.
A pessoa temperante sabe pesar e dosear bem as palavras. Pensa no que diz. Não permite que um momento de raiva arruíne relacionamentos e amizades que depois só podem ser reconstruídos com dificuldade. Especialmente na vida familiar, onde as inibições diminuem, todos corremos o risco de não controlar tensões, irritações, raivas. Há um tempo para falar e um tempo para calar, mas ambos requerem a medida certa. E isto é válido para muitas coisas, por exemplo, estar com os outros e estar sozinho.
Se a pessoa temperante sabe controlar a sua irascibilidade, não significa necessariamente que a veremos sempre com um rosto pacífico e sorridente. Com efeito, às vezes é necessário indignar-se, mas sempre na medida certa. Eis as palavras: a medida certa, a maneira certa. Uma palavra de repreensão é por vezes mais saudável do que um silêncio azedo e rancoroso. O temperante sabe que nada é mais inconveniente do que corrigir o outro, mas sabe também que é necessário: caso contrário, dar-se-iam rédeas soltas ao mal. Em certos casos, o temperante consegue conciliar os extremos: afirma princípios absolutos, reivindica valores não negociáveis, mas sabe também compreender as pessoas e demonstra empatia por elas. Demonstra empatia.
Portanto, o dom do temperante é o equilíbrio, uma qualidade tanto preciosa quanto rara. Com efeito, tudo, no nosso mundo, impele ao excesso. Ao contrário, a temperança combina bem com atitudes evangélicas como a pequenez, a discrição, o escondimento, a mansidão. Quem é temperante aprecia a estima dos outros, mas não faz dela o único critério de cada ação e de cada palavra. É sensível, sabe chorar e não se envergonha de o fazer, mas não chora sobre si próprio. Derrotado, levanta-se de novo; vitorioso, é capaz de regressar à sua vida escondida de sempre. Não procura aplausos, mas sabe que precisa dos outros.
Irmãos e irmãs, não é verdade que a temperança torna a pessoa cinzenta e desprovida de alegria. Pelo contrário, faz saborear melhor os bens da vida: o estar juntos à mesa, a ternura de certas amizades, a confidência com pessoas sábias, a admiração pelas belezas da criação. A felicidade com temperança é alegria que floresce no coração de quem reconhece e valoriza o que mais conta na vida. Oremos ao Senhor para que nos conceda esta dádiva: o dom da maturidade, da maturidade da idade, da maturidade afetiva, da maturidade social. O dom da temperança!
Papa Francisco
audiência geral 17.04.24
Catequeses. Os vícios e as virtudes. 13. A justiça
Eis-nos na segunda virtude cardeal: hoje falaremos da justiça. É a virtude social por excelência. O Catecismo da Igreja Católica define-a assim: «A virtude moral que consiste na vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido» (n. 1807). Eis em que consiste a justiça. Muitas vezes, quando se fala de justiça, cita-se também o lema que a representa: “unicuique suum”, ou seja, “a cada um o que é seu”. É a virtude do direito, que procura regular com equidade as relações entre as pessoas.
É representada alegoricamente pela balança, dado que se propõe “acertar as contas” entre os homens, sobretudo quando elas correm o risco de ser falsificadas por algum desequilíbrio. A sua finalidade é que, numa sociedade, cada um seja tratado de acordo com a própria dignidade. Mas já os antigos mestres ensinavam que para isto são necessárias também outras atitudes virtuosas, como a benevolência, o respeito, a gratidão, a afabilidade e a honestidade: virtudes que contribuem para a boa convivência entre as pessoas. A justiça é uma virtude para a boa convivência entre as pessoas.
Todos nós compreendemos que a justiça é fundamental para a convivência pacífica na sociedade: um mundo sem leis que respeitem os direitos seria um mundo no qual é impossível viver; assemelhar-se-ia a uma selva. Sem justiça, não há paz. Sem justiça, não há paz. Com efeito, se a justiça não for respeitada, geram-se conflitos. Sem justiça, consagra-se a lei da prevaricação do forte sobre os fracos, e isto não é justo!
Mas a justiça é uma virtude que age tanto no grande, como no pequeno: não diz respeito apenas às salas dos tribunais, mas também à ética que distingue a nossa vida diária. Estabelece relações sinceras com os outros: atua o preceito do Evangelho, segundo o qual o falar cristão deve ser: «“Sim, sim”, “Não, não”; o resto vem do Maligno» (Mt 5, 37). As meias-verdades, os discursos subjetivos que procuram enganar o próximo, as reticências que ocultam as verdadeiras intenções não são atitudes conformes com a justiça. O homem justo é reto, simples e direto, não usa máscaras, apresenta-se como é, diz a verdade. A palavra “obrigado” está frequentemente nos seus lábios: sabe que, por mais que nos esforcemos por ser generosos, somos sempre devedores para com o próximo. Se amamos, é também porque primeiro fomos amados.
Na tradição, podem-se encontrar inúmeras descrições do homem justo. Vejamos algumas. O homem justo tem veneração pelas leis e respeita-as, consciente de que elas constituem uma barreira que protege os indefesos da prepotência dos poderosos. O homem justo não se preocupa apenas com o seu bem-estar individual, mas deseja o bem de toda a sociedade. Por isso, não cede à tentação de pensar só em si mesmo e de cuidar dos próprios assuntos, por mais legítimos que sejam, como se fossem a única coisa que existe no mundo. A virtude da justiça torna evidente - e coloca a exigência no coração - que para mim não pode haver verdadeiro bem, se não houver também o bem de todos.
Por isso, o homem justo vela sobre o próprio comportamento para não lesar os outros: quando erra, pede desculpa. O homem justo pede sempre perdão. Em certas situações, chega a sacrificar um bem pessoal para o pôr à disposição da comunidade. Deseja uma sociedade ordenada, onde sejam as pessoas a dar brilho aos cargos, não os cargos a dar brilho às pessoas. Abomina as preferências e não troca favores. Ama a responsabilidade e é exemplar na vida e na promoção da legalidade. Com efeito, ela é o caminho para a justiça, o antídoto contra a corrupção: como é importante educar as pessoas, especialmente os jovens, na cultura da legalidade! É o caminho para prevenir o cancro da corrupção e para debelar a criminalidade, removendo o solo debaixo dos seus pés.
Além disso, o homem justo evita comportamentos nocivos como a calúnia, o falso testemunho, a fraude, a usura, a falsidade e a desonestidade. O homem justo mantém a palavra dada, devolve o que lhe foi emprestado, reconhece o salário correto a todos os operários - o homem que não reconhece o salário correto aos operários não é justo, é injusto - tem o cuidado de não pronunciar juízos temerários em relação ao próximo, defende a reputação e o bom nome dos outros.
Nenhum de nós sabe se no nosso mundo os homens justos são numerosos ou raros como pérolas preciosas. Mas são homens que atraem a graça e as bênçãos, tanto para si como para o mundo em que vivem. Não são perdedores em comparação com aqueles “astutos e espertos”, porque, como diz a Escritura, «quem procura justiça e amor encontrará vida e glória» (Pr 21, 21). Os justos não são moralistas que se revestem de censores, mas pessoas íntegras que «têm fome e sede de justiça» (Mt 5, 6), sonhadores que acalentam no coração o desejo de uma fraternidade universal. E deste sonho, especialmente hoje, todos nós temos grande necessidade. Devemos ser homens e mulheres justos, e é isto que nos tornará felizes!
Papa Francisco
Audiência geral 3 de abril de 2024
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